terça-feira, 22 de setembro de 2015

Direito Processual Penal - Capítulo I

1. Visão Histórica


No Direito Romano os crimes eram divididos da seguinte forma: Delitos Públicos - praticados contra a segurança da cidade e o parricídio, e os Delitos Privados - praticados contra particulares.  Já na antiguidade prevalecia a ideia de que os crimes seriam públicos ou particulares, o que até hoje se mantém quando falamos ainda em ação penal pública e ação penal privada. Os antigos ainda mantinham a ideia que existem crimes que afetam toda a coletividade, os chamados delitos públicos e os chamados delitos particulares que afetam tão somente a pessoa, que hoje são apurados pela ação penal privada.

No primeiro delito, os delitos públicos, a aplicação da sanção era severa e nenhuma garantia era dada ao acusado, ficando a punição a cargo do julgador, que julgava apenas com o polegar. Já nos Delitos Privados, a função do Estado era apenas de árbitro, onde se prestigiava a conciliação entre as partes e a penalidade era aplicada apenas em último caso. Observe-se que desde a antiguidade se procurava a composição de danos que hoje ainda é preservada quando falamos na transação penal que é tutelado pela Lei dos Juizados Especiais, ao prever que a indenização ou reparação do danos é uma forma de transação penal e no caso de ação penal publica condicionada, uma vez reparado o dano, o direito de representação também desaparece.

No Direito Germânico, os crimes privados eram punidos com a Vingança Privada e, mais tarde, pela Composição.  A chamada vingança privada, nada mais é do que a conhecida Lei de Talião, ou do Olho por olho e dente por dente, evoluindo posteriormente para a composição dos danos como forma de reparação do dano e de despenalização, vez que em alguns crimes a vítima não objetiva a prisão do cidadão, mas sim deseja ser ressarcida dos danos causados.

Vigorava a denominada ordália ou “juízo de Deus”, que nada mais era do que punições corporais impostas aos acusados pelos juízes (água fervente, ferro em brasa, fogo etc..), caso em que, se o acusado sobrevivesse, significaria que Deus o absolveu de seus pecados, sendo, em razão disso, perdoado pela justiça humana.

Posteriormente, houve forte influência do Direito Canônico, em que o processo e a consequente punição somente poderiam ser exercidos se fossem apresentados pelos representantes da Igreja. Todavia, com o passar dos anos, o processo também passou a ser inquisitivo, com o escopo de punir a heresia, o sortilégio e as bruxarias. A colaboração da Igreja neste ponto da história é significativa, pois deve-se a Igreja a introdução no Direito da chamada pena de reclusão (onde os religiosos ao se verem diante do pecado, recolhiam-se a uma cela para purificarem seus pecados e ficavam reclusos em penitencia), observando o atento leitor que a palavra reclusão e a palavra penitenciária, como regime de cumprimento de pena e pena, já existiam na antiguidade.

Finalmente, surgiu o Processo Penal Moderno, também denominado período humanitário do Direito Penal, proibindo as torturas e os julgamentos secretos, evitando que o juiz agisse como verdadeiro inimigo do acusado, instituindo no processo a fase inquisitória (investigatória) e a fase de julgamento e produção de provas, e também garantindo ao acusado o direito de recorrer da decisão desfavorável e o cumprimento humano da pena.



1.2. Conceito do Direito Processual Penal.


O processo, como é cediço, é maneira pela qual o Estado aplica sua jurisdição para resolver os conflitos de interesses. Assim, o Estado atua na vida em sociedade, buscando preservar a paz e o equilíbrio das relações sociais. O Estado então é detentor exclusivo do direito de punir, sendo vedado ao particular agir com suas próprias mãos, sob pena de cometer crime de exercício arbitrário das próprias razões.

O Processo Penal encontra-se intimamente ligado com o Direito Penal. Este descreve os atos punidos com a norma repressiva e aquele serve como instrumento da aplicação das sanções jurídicas. O Direito Penal, em suma prevê os fatos que são considerados como crime, sendo complementado pelo Direito Processual Penal que disciplina a coordenação de todos os atos do processo desde a ocorrência do crime até seu julgamento, regulando, inclusive, a execução da pena.

Assim, nada mais é do que uma série de atos coordenados, com a finalidade de aplicar a lei penal àqueles indivíduos que infringiram uma norma descrita como crime no Direito Material. Como se sabe, o Estado é o detentor do “jus puniendi”, ou seja, o direito de punir, sendo o processo o meio pelo qual o Estado aplica o Direito Material para atingir a composição da lide.

Para tanto, No Processo Penal temos a existência do sistema misto, que engloba a primeira fase, denominada de INVESTIGATIVA, e a segunda fase, denominada de CONTRADITÓRIO, sendo um processo ACUSATÓRIO, com as funções bem definidas de Juiz, Acusador, Réu e seu defensor. Note-se ainda que o direito de defesa é considerado como um verdadeiro direito indisponível, onde a defesa deve ser exercida em toda a sua plenitude, com todos os meios, sendo facultado ao Juiz destituir o defensor se o acusado não defendido a contento. No Direito Processual Penal Brasileiro, o sistema utilizado é o acusatório.


1.3. O Ato Ilícito.


Como se sabe, um ato humano pode gerar consequências na órbita da vida em sociedade, podendo conter uma sanção meramente moral, uma sanção civil ou uma sanção de natureza penal. São com estes últimos atos, os quais infringem dispositivos do Código Penal, amparados pelo Código de Processo Penal, que dá às partes o caminho para a aplicação da pena correspondente ao crime infringido. O ato ilícito, pois, pois atingir várias esferas, sendo que uma tem direta interferência sobre a outra. Quando a sentença penal transitada em julgado, e é de natureza condenatória, se transforma na esfera cível em título executivo, ao passo que, se o acusado for absolvido por alguma excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal o u exercício regular de um direito), uma vez reconhecida, retira da vitima o direito à ação civil.


1.4. O “Jus Puniendi”.


Como regra geral, o direito de punir pertence ao Estado, que o procura através do Ministério Público nas ações penais públicas incondicionadas e condicionadas. Nestes tipos de ação penal, o interesse do Estado se sobrepõe ao interesse do particular. Via de regra, as ações penais são sempre públicas incondicionadas; todavia, existem casos dentro de nosso ordenamento jurídico em que o interesse da vítima se sobrepõe ao interesse estatal, razão pela qual este delega a esta o “jus persequendi in judicio” e o exercício do direito de ação passa a ser de responsabilidade destas.


1.5. Conteúdo do Processo Penal.


O processo penal nada mais é do que uma série de atos que compreendem quatro fases distintas:

a) A formulação da acusação que se dá através da apresentação da denúncia ou da Queixa;
b) a produção das provas tanto a defesa quanto a acusação podem requerer e produzir as provas que entendem necessárias ao exercício da acusação e da defesa;
c) o exercício do direito de defesa em alguns casos verbalmente, e em outros através da defesa ou resposta preliminar  e
d) o julgamento da lide onde se exige que todas as decisões judicias sejam fundamentadas sob pena de nulidade.

  1.5.1. O Processo Penal tem suas finalidades, em duas grandes vertentes:


I - O PROCEDIMENTO: que é uma série de atos pré ordenados que norteiam o processo desde a sua proposição (com a denúncia) até a prolação de sentença. É o caminho que se deve percorrer para se chegar a um resultado fim (MÉTODO). Temos assim, exemplificamente o PROCEDIMENTO ORDINÁRIO, SUMÁRIO, SUMARÍSSIMO, DO JURI, ou mesmo aqueles previstos em lei especial como aquele previsto na lei de drogas;

Assim, este caminho é distinto para cada crime, que depende da quantidade de pena aplicada a cada um deles (no caso o máximo da pena cominada ao crime e ou o tipo do crime como aqueles contra a vida ou da lei de drogas), para que saibamos qual tipo de procedimento será utilizado, como o procedimento sumário, ordinário ou sumaríssimo.

II - UMA RELAÇÃO JURÍDICA: o processo é um ato formado pelo Juiz, pelo Ministério Público, pelo Acusado (réu) e pelo seu Defensor. Cada uma destas partes possuem direitos e obrigações, dentro dessa relação jurídica.


1.6. Relações do Processo Penal com as demais ciências.


Em razão de ser uma ciência, o processo penal está inter-relacionado a outras, denominadas “ciências auxiliares”, visando a facilitar sua aplicabilidade prática.

Nessa esteira, o Processo Penal relaciona-se com as seguintes ciências:

a) Política Criminal: a fim de propiciar critérios para apreciação do valor da norma vigente e propor modelo de norma a vigorar.

b) Criminologia: relaciona-se com o processo penal por ser uma ciência se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo.

c) Medicina Legal: auxilia a conclusão do resultado final do processo, através de exames periciais que são elaborados pelos peritos quando da averiguação da inimputabilidade do réu, focando tanto sua sanidade mental, como as sequelas produzidas pelo criminoso na vítima.

d) Psiquiatria Forense: ciência auxiliar que se ocupa do estudo da criminologia, como, por exemplo, o estudo das doenças mentais que levam o agente ao delito, tendo fundamental importância na aplicação do artigo 26 do Código Penal.

e) Polícia Judiciária: voltada para a descoberta dos autores do crime, da materialidade e do “modus operandi” de cada um desses agentes.
        
              

1.7. Relações do Processo Penal com outros ramos do Direito.


Como o processo penal advém do Direito Público, onde predomina o interesse público sobre o interesse privado, verifica-se que o mesmo relaciona-se também com outros ramos do Direito, quais sejam:

a) Direito Constitucional: haja vista a Constituição ser a Lei Maior, todas as matérias que disciplinam as condutas humanas são subordinadas às normas constitucionais. Assim, a tutela da liberdade, por exemplo, relaciona-se com o processo penal como instrumento da realização da Justiça.

b) Direito Administrativo: através do processo são reguladas a aplicação das sanções administrativas disciplinares e a respectiva aplicação da pena.

c) Direito Comercial: reserva íntima ligação com o processo falimentar, haja vista que a falência muitas vezes pode ser fraudulenta e constituir delitos.

d) Direito Internacional: conduz a adoção de normas comuns entre os países, visando a aplicação de uma só lei, buscando reprimir condutas criminosas. Temos como exemplo o Mercosul e a Comunidade Econômica Europeia.

e) Direito Processual Civil: há uma tendência moderna de se unificar os ordenamentos processuais civis e penais em um só, haja vista que em ambas as matérias existe uma que engloba os conceitos básicos do processo: que é a Teoria Geral do Processo.


1.8. Fontes do Direito Processual Penal. 

A fonte é onde se origina a norma; é o seu modo de criação. Isto se chama FONTE DE PRODUÇÃO.

 As fontes classificam-se em:

Fonte de Produção Primária: são as normas de Direito Processual Penal criadas pelo Estado, pois cabe privativamente à União legislar sobre direito processual. Frise-se que não pode ser instituída norma de direito penal ou de direito processual por meio de Medida Provisória. As normas de direito processual devem ser produzidas através de processo legislativo regular, sendo competência da União legislar sobre o tema.

Fontes Formais ou Secundárias: são fontes pelas quais se exteriorizam a aplicação da norma penal, servindo muitas vezes como elementos criadores de uma norma processual.

Fontes Formais Diretas: trata-se da legislação principal, ou seja, a existência da própria norma sem si, não necessitando ser criada. Tem-se como exemplo o Código de Processo Penal, as Legislações Extravagantes e Leis Orgânicas. 

Fontes Formais Indiretas: na existência de lacunas, obscuridade ou falta de lei, o que não exime o Juiz de decidir, situação esta também conhecida como non liquet, utiliza-se o critério ampliativo que busca a solução da lide através dos Princípios Gerais de Direito, Analogia, Costumes e Jurisprudência.

Vale ressaltar dois requisitos: primeiramente, que a lei é a fonte do direito processual penal e, secundariamente, o processo penal é uno em todo o território brasileiro


1.9. Aplicação da lei processual no tempo e no espaço


No tempo: pelo princípio da imediatidade, a lei penal tem aplicabilidade imediata, sem prejuízo da validade dos atos realizados.

A lei processual entra em vigência automaticamente, atingindo processos em andamento. Isto aconteceu de forma recente com as novas leis processuais que tiveram aplicabilidade aos processos em curso, com a concentração dos atos em uma só audiência, interrogatório do acusado ao final e debates orais.
  
No espaço: foi adotado o princípio da territorialidade, pelo qual as leis não ultrapassam os limites do estado que as promulgou.


1.10. A Interpretação da Lei Processual:


a) Vista sob o aspecto subjetivo, pode ser:

I - Autêntica: quando realizada pelo próprio legislador. Ex.: Exposição de motivos.

II- Doutrinária: quando sua interpretação é realizada pelos doutrinadores e comentadores.

III- Judicial: quando realizada pelos juízes e Tribunais, ao aplicarem-na a um caso concreto.

b) Vista sob o aspecto objetivo, pode ser:

I- Gramatical: visando a compreender o sentido das palavras empregadas. Ex.: Queixa, competência, parte.

II- Lógica: objetiva demonstrar a vontade ou a finalidade da lei. Vista sob os aspectos sistemático, histórico, direito comparado, extrajurídico e sociológico.

c) Vista em relação ao resultado, pode ser:

I- Declarativa: quando esclarece alguma dúvida do texto.

II- Extensiva: amplia o alcance do texto.

III- Restritiva: quando restringe a aplicação da norma.

IV- Analógica: sua forma de interpretação serve para suprir certas falhas, pela impossibilidade de descrição no texto penal, remetendo a outro que os englobe.

V- Progressiva: para fins de adaptar a norma às necessidade atuais.
  

2. Princípios do Processo Penal.

  
Os princípios concernentes à aplicação do Direito Processual Penal vêm consignados tanto na Constituição Federal, como também consagrados dentro de legislações alienígenas.

Sabe-se que o processo tem dupla garantia: em primeiro lugar para o autor, que socorre-se da norma penal para ver garantida a aplicabilidade de sanção àquele indivíduo que infringiu uma disposição penal. Temos aí consignada a garantia ativa.

Por outro lado, também o processo reveste-se de uma garantia passiva, haja vista que o réu só será privado de sua liberdade após percorrido o devido processo legal e depois de garantido o contraditório e ampla defesa.

Temos garantias constitucionais expressas, previstas na Constituição Federal, e garantias constitucionais implícitas, que são aquelas não mencionadas expressamente em nossa Carta Magna.

Vê-se claramente, pela numeração de tantos princípios, que o Processo Penal foi construído com base na perspectiva do réu em que se prestigia a dignidade humana.


2.1. Principais Princípios


Magistratura: o juiz deve ser sempre imparcial. O acusado, ao cometer um crime, deve saber de antemão qual o juízo que vai processá-lo e julgá-lo. Isso é o que se denomina “juiz natural” ou “juiz constitucional”. Vedada é a criação dos tribunais de exceção – “criados ad hoc e post factum em situação revolucionária para o julgamento de determinados casos”. O acusado tem o direito de conhecer previamente o tribunal ou o juiz, no caso de infração penal. Caso duvide da imparcialidade do julgamento, poderá se voltar contra tal fato através da exceção de suspeição, ou, em caso de julgamento pelo Tribunal do Júri, através do desaforamento. Para tanto os juízes tem suas garantias como a inamovibilidade, a irredutibilidade de vencimentos e a inamovibilidade, para não sofrerem pressões externas, pois sabemos que, em muitos casos, na parte passiva, principalmente no área cível a União, o Estado e os Municípios são figuras constantes.

Princípio da Verdade Real: o juiz deve, através das provas e das averiguações, descobrir a verdade como fundamento de uma sentença. O principio da verdade real vai além, pois o Juiz muitas vezes, adota uma postura verdadeiramente ativa. Quando não se sente convencido, por exemplo, e necessita de maiores elementos de prova pode determinar a conversão do processo em diligência, determinando a oitiva de alguma testemunha (testemunha do Juiz), de oficio, pode determinar a busca e apreensão de algum documento, designar nova pericia etc.

Princípio da Imparcialidade do Juiz: traduz independência, decisões livres, desprovidas de coação ou ameaças. Para tanto, os magistrados têm garantias da irredutibilidade de vencimentos, inamovibilidade e vitaliciedade.

Princípio da Igualdade das Partes: indica que o autor e réu, embora em planos opostos, têm os mesmos direitos, ônus, obrigações e faculdades. Paridade de armas.

Princípio do Livre Convencimento Motivado: consagrado no artigo 157 do CPP, impede que o Juiz julgue o processo utilizando-se de conhecimento que possua extra autos. O que não existe no processo, não existe no mundo jurídico. Este convencimento do Juiz deve ser exteriorizado na sentença, na motivação do julgador, sob pena de nulidade do julgado.

Princípio da Publicidade: vigora a publicidade absoluta, segundo a qual todos os atos processuais são públicos. Alguns processos, todavia, militam no foro em segredo de justiça, tal como ocorre, por exemplo, com os delitos sexuais ou de drogas.

Princípio do Contraditório: diretamente relacionado com o princípio do “due process of law”, segundo o qual o acusado goza do direito de amplitude de defesa e contrapor-se a qualquer prova contra ele produzida.

Assistência Jurídica Gratuita: todo o acusado necessita de um defensor. Este defensor pode ser contratado pelo acusado ou pode ser nomeado pelo Estado. Esta é a defesa técnica que, ao lado da autodefesa, formam o princípio constitucional da ampla defesa. Além de ter uma defesa por advogado inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, o acusado tem o direito, mormente se preso estiver, de estar presente na audiência de produção de provas, sob pena de nulidade do processo.

Princípio da Iniciativa das Partes: Nemo judex sine actore”. Não há juiz sem autor. Não existe prestação jurisdicional sem a movimentação da máquina estatal judiciária por iniciativa das partes envolvidas, que se dá a partir da propositura de Denúncia, e o procedimento investigatório se inicia após a ocorrência de um crime.

Princípio do Ne Eat Judex Ultra Petita Partem: o juiz não pode sentenciar sobre aquilo que não foi pedido pela parte. Com a denúncia, a apreciação do juiz apenas se dará sobre aquilo que foi pedido pela parte, pois o pedido delimita a atuação do órgão jurisdicional.

Princípio da Identidade Física do Juiz:  o juiz que deu início à instrução probatória deve julgar a lide. Pelas novas reformas do processo penal, o juiz que conduziu a audiência de produção de provas fica vinculado ao processo, devendo proferir a sentença. Aquele que presidiu a audiência de colheita das provas, fica vinculado ao processo, e deve proferir a decisão.

Princípio do Devido Processo Legal: dogma constitucional, pois ninguém poderá ser condenado sem a existência do processo previsto em lei.

Princípio da Inadmissibilidade das Provas Obtidas por Meio Ilícito: prova produzida por meio ilícito não é admitida em nosso ordenamento jurídico. É a chamada Teoria da árvore dos frutos envenenados. (Fruits of the poisons tree). O nosso regramento processual sobre a prova ilícita proíbe de forma expressa a utilização de provas produzidas por meios ilícitos ou derivadas destas.

Princípio da Inocência: por este princípio, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Trata-se do Princípio do humanismo constitucional. Note-se que, dentro deste princípio encontra-se também o princípio de que o réu não é obrigado a produzir prova contra si mesmo.

Princípio do Favor Rei: sempre em favor do réu. In dubio pro reo, ônus da prova sempre da parte acusadora, exceto nos casos de alegação de excludente da ilicitude ou de álibi. Temos como principais Direitos do Cidadão Brasileiro:

a) direito a habeas corpus;
b) direito ao silêncio;
c) direito de identificar a pessoa que o prendeu;
d) não submissão à identificação criminal;
e) respeito à pessoa do preso;
f) direito de individualização da pena;
g) reserva legal;
h) direito de liberdade;
i) fiança e liberdade provisória;
j) Júri Popular.

 Princípio da Separação da Apuração da Responsabilidade Civil e Responsabilidade Criminal. As jurisdições civil e penal são independentes, mas se relacionam. Pela nova reforma processual deve ser apontado que o juiz na sentença penal condenatória pode fixar valor mínimo de indenização. Também deve ser mencionado que a sentença penal condenatória com trânsito em julgado, na esfera cível, é título executivo judicial. Também necessário se afirmar que a sentença penal que reconhece ter sido praticado o fato sob qualquer excludente de ilicitude, faz desaparecer o direito indenizatório, e também que o juiz do cível pode suspender a ação civil por até um ano até o julgamento da esfera criminal e que não corre a prescrição para a propositura de ação indenizatória enquanto não passar em julgado a sentença penal condenatória.

Princípio da Motivação das Decisões e o Livre Convencimento dos Jurados (Não Motivado). Todas as decisões, como explicitado anteriormente, devem ser fundamentadas, havendo uma única exceção no direito processual, que é o julgamento pelo Tribunal do Júri. Neste, os jurados decidem sobre o destino do acusado através de votação secreta, com cédulas “sim” e “não” sem necessitarem expor as suas convicções.

Princípio do In Dubio Pro Societate - tal princípio é aplicado na primeira fase do procedimento do Júri, onde, havendo dúvidas sobre a ocorrência de situação exculpante (qualificadora), deve o Júri Popular decidir a questão por força de mandamento constitucional.


2.3.  O Interesse


Um dos principais elementos de sustentação do processo é o INTERESSE.

O interesse é uma relação existente entre os homens e os bens que, dependendo das circunstâncias ou acontecimentos, pode ser maior ou menor.

O Estado, como se viu anteriormente, tem o dever de manter íntegra a relação entre as pessoas que formam uma coletividade; para tanto, se vale da imposição de normas sancionadoras para garantir a paz social.

2.3.1.  O Conflito de Interesses


Ocorre conflito de interesses quando um membro da coletividade infringe um interesse comum, qual seja, os atos criminosos e dentro deste principio está implícito o principio da segurança e da estabilidade das decisões judiciais, não se permitindo a repropositura de demandas já julgadas.

Para que as relações sociais permaneçam estáveis, necessário foi que o Estado ditasse normas comportamentais sancionadoras de atos praticados que configurariam o crime. Estas normas de condutas tipificadas como crime são chamadas de direito objetivo, eis que normatizados o policiamento e punição das regras de conduta ilícitas.
  

2.3.2. A Relação Jurídica:


Surge então o que denominamos de Relação Jurídica, que é a tutela legal dos conflitos de interesses, com a função de distinguir, entre duas posições, qual delas deve prevalecer. Trata-se de um conflito de interesses compreendendo dois polos absolutamente distintos: um polo ativo (quem pede) e um polo passivo (contra quem é dirigido o pedido).
 Para regular o pedido e a resistência surge o direito subjetivo.  O direito subjetivo tem a árdua missão de tutelar essa relação jurídica formada entre a parte ativa e a parte passiva. São os meios colocados à disposição dos cidadãos (acesso à justiça), para que, através do Estado, faça atuar, no caso concreto, o direito objetivo.

O direito subjetivo ou direito formal compreende uma série de atos para atuar a lei (objetiva) ao caso concreto.

De ambos os lados, nota-se a presença da pretensão, que pode ser conceituada como uma exigência de subordinação de um interesse próprio sobre um interesse alheio. Neste diapasão, temos a forma consensual e a forma resistencial.

Dessa forma, no campo do Direito Processual Penal, temos na parte ativa de uma relação processual, o Estado, que tem o interesse de punir e, no outro campo, temos a resistência do acusado, em não querer ser punido. Na parte ativa, a grosso modo, quem acusa; e na parte passiva, quem se defende, o réu.

Forma-se a lide, que é o conflito de interesses (Estado X particular) qualificado por uma pretensão resistida (o réu, no mais das vezes, resiste bravamente através do direito de defesa a aplicação da pena).

A lide perturba a paz social e é dever do Estado preservá-la; em caso de violação ao direito objetivo, cabe ao ente estatal intervir, para restabelecer o status quo ante.
  

2.3.3. O Processo


A paz social volta a reinar na sociedade com a aplicação do direito objetivo ao caso concreto, através da pronta atuação do Poder Judiciário e isto se faz através do que denominamos de PROCESSO.

Processo é o meio para a composição da lide, através da aplicação da lei ao caso concreto, sendo seu instrumento indispensável.

Sabemos que o Estado é o detentor do monopólio da jurisdição e da administração da justiça, chegando à inexorável conclusão de que ninguém pode fazer justiça pelas próprias mãos, sob pena de responder pelo delito constante do artigo 345 do Código Penal - exercício arbitrário das próprias razões.

Assim, uma visão moderna do processo pode derivar duas óticas diferentes: a primeira de forma objetiva, que é identificada pelo procedimento (caminhos ou atos coordenados a se conseguir um objetivo fim), e outra visão subjetivista, ou seja, uma relação jurídica com a presença de duas partes: uma ativa e outra passiva.

Na ótica subjetiva podemos destacar os sujeitos processuais, na visão de Liebman, o processo é actum trium personarum, ou seja, constatamos a presença de três pessoas juiz, autor e réu. Aqui se faz necessário um apontamento, visto que no direito processual penal a defesa do acusado é essencial, considerada até como um direito indisponível, que não pode ser alijada sob qualquer pretexto.

A finalidade do processo é a preservação da paz social, com a proteção dada pelo Direito Objetivo da vida, integridade física, moral, do Estado, da família, aplicando-se ao violador a norma e a sanção previstas pelo Direito Objetivo.

Temos então a ação. Como se sabe, são três as condições da ação: Possibilidade Jurídica do Pedido, Legitimação e Interesse de Agir. Ausentes qualquer uma dessas condições, temos a carência da ação.

De outro lado, temos também para validação do processo os denominados Pressupostos Processuais, os quais têm grande importância porque deles dependem o desenvolvimento válido e regular do processo.

Como todo o ato jurídico, o processo exige agente capaz (no processo penal o réu deve ter idade igual ou superior a 18 anos e não pode ser inimputável), objeto lícito (não há crime sem lei anterior que o defina e nem pena sem prévia cominação legal) e forma prescrita em lei (no caso o procedimento devidamente previsto em lei). O processo, portanto, deve estrita obediência a certas circunstâncias que, na sua ausência, causam a nulidade do processo.

Dividem-se os pressupostos processuais em duas grandes categorias: pressupostos objetivos, que dizem respeito ao processo e os pressupostos subjetivos, que guardam relação com as partes do processo.

Dentre os pressupostos objetivos, destacam-se: inexistência de litispendência, coisa julgada, uma petição apta, a citação, e o mandado.

Temos por exemplos: a investidura do juiz, a delimitação de sua competência e sua imparcialidade e em relação às partes: capacidade de ser parte, capacidade de estar em juízo (ad processum), e a capacidade postulatória.


3. Questões Dissertativas


01 - Em que ramo do Direito se enquadra o objeto do Direito Processual Penal?
R: Ramo do Direito Público interno, regulador da atividade do Estado de julgar ilícitos penais, com a aplicação das penas equivalentes.

02 - Quais os principais princípios que regem o Processo Penal?
R: Do Devido Processo Legal; Garantia do Contraditório; Garantia de Ampla 
Defesa; da Inocência Presumida; Proibição de Provas Obtidas por Meios Ilícitos; da Publicidade dos Atos Processuais; do Juiz Natural; do Impulso Oficial; da Verdade Real; da Legalidade; da Ordem Processual.


03 - Qual o fundamento do Devido Processo Legal?
R: Para que sejam observadas todas as formalidades, em que a autoridade competente ouve as partes, permitindo ao réu ampla defesa, instaurando-se o contraditório e a produção de todo tipo de prova, não sendo esta por meio ilícito, a ser produzida em juízo. Ar.t. 5º, LIV, CF.

04 - Qual o fundamento da garantia do contraditório?
R: Fundamenta-se em permitir ao réu a utilização de quaisquer meios, juridicamente permitidos, para defesa das acusações formuladas contra ele, podendo provar os fatos que alega. Ar.t. 5º, LV, CF.

05 - Qual o fundamento da ampla defesa?
R: Na permissão ao réu, no devido momento processual, de utilizar de todos os meios processuais e materiais para defender-se das acusações formuladas contra ele. Ar.t. 5º, LV, CF.

06 – Em que consiste o princípio da inocência presumida?
R: Consiste no fato de considerar-se inocente toda e qualquer pessoa, não sendo considerado culpado até que a sentença penal condenatória tenha transitado em julgado.

07 - O que são provas obtidas por meios ilícitos?
R: Provas obtidas por meio de fraude, manipulações, artimanhas, simulações, etc., São provas motivadas, não sendo por meio natural e sim provocadas. Um exemplo clássico é a escuta telefônica sem consentimento das partes e/ou autorização judicial.

08 - Qual o fundamento do princípio da publicidade dos atos processuais?
R: Fundamenta-se na execução dos atos processuais penais, não podendo estes ser feitos em segredo da sociedade em geral. Ar.t. 5º, LX, CF.

09 - As exceções à publicidade do processo penal são:
R: Defesa  da intimidade e interesse social. Ar.t. 5º, LX, CF.

10 - Explique o princípio do juiz natural.
R: É o direito de qualquer pessoa de ser julgada segundo as leis brasileiras, pela autoridade competente. Art. 5º, LIII, CF.

11 - O que é o princípio do impulso oficial?
R: Uma vez iniciada a ação penal, o processo deverá prosseguir, sendo obrigado o juiz a conservar a ordem dos atos processuais e o desenvolvimento do processo, não podendo extingui-lo, exceto nos casos expressamente previstos. Este princípio também obriga o Ministério Público a não desistir da ação.

12 - O que se entende por princípio da verdade real?
R: Para a Justiça criminal, interessa para apurar a verdade real dos fatos, em oposição a verdade formal. Buscando o Juiz Criminal, a apuração do que efetivamente houve.

13 - O que se entende por princípio da legalidade, ou também chamado de princípio da obrigatoriedade?
R: É a obrigação do Estado de exercer o direito de punir, através dos órgãos encarregados da persecução penal. A autoridade policial tem o dever de instaurar o inquérito policial e o órgão do Ministério Público a promover a ação penal, quando esta forem relativa a crimes julgados por meio de ação penal pública.

14 - O que se entende por princípio da ordem processual?
R: Significa que as fases processuais anteriores, já concluídas e superadas, não podem sermais repetidas devendo ser o processo passado para a fase seguinte, salvo disposição legal expressa em contrário.

15 - Discorra sobre os sistemas existentes de processo penal.
R: Existem três sistemas, sendo eles:
     a) INQUISITÓRIO, no qual a autoridade judiciária é responsável por todas as fases da persecução penal, sendo ao mesmo tempo acusador, defensor e juiz;
     b) ACUSATÓRIO, cujas três funções são separadas por lei, onde cada uma delas é exercida por pessoa diversa;
     c) MISTO, que é a combinação das duas modalidades, inquisitório e acusatório.

16 - No Processo Penal Brasileiro é adotada qual espécie?
R: No Brasil adota-se o sistema do princípio acusatório.

17 - O que se entende por princípio da territorialidade?
R: É um princípio de determina que os dispositivos do Código de Processo Penal são aplicados a toda extensão do território brasileiro, salvo as exceções legais.

18 - Quando ocorrer conflito entre tratado internacional e lei processual penal brasileira, qual deverá prevalecer?
R: Se o tratado for ratificado no Brasil, este prevalecerá.

19 - O que se entende por princípio imediato da lei?
R: É aquele adotado pelo legislador brasileiro, quanto à eficácia da lei processual no tempo, não retroagindo esta para sua aplicação.

20 - Quando não existir previsão legal expressa, como poderá atuar o juiz?
R: Através da interpretação extensiva, valendo-se do uso da analogia e a aplicação dos princípios gerais do Direito.



Por: Dr Arlindo Peixoto Gomes Rodrigues


Prova, NP1

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