INTRODUÇÃO
O trabalho exposto faz referência ao
crime preterdoloso, um assunto amplamente discutido e que tem como base a
análise subjetiva do delito. Não deve haver controvérsia com relação à presença
da imputação objetiva e dos elementos do fato material, pois estes já devem
estar implícitos para que se chegue a indagação da existência ou não da prática
desta espécie de crime. A discussão vai além, abordando temas resididos nos
elementos subjetivos e na questão da tipicidade. Os principais alvos de estudo
aqui abordados são o dolo e a culpa, estabelecendo conceitos, parâmetros e
limitações para que se possa, finalmente, afirmar se houve ou não o preterdolo,
daí a importância da produção deste artigo científico e dos elementos aqui
descritos.
CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO
Crimes qualificados pelo resultado são
condutas cometidas pelo agente caracterizadas como crime, mas que possuem um
resultado acrescentado, gerando um agravamento da sanção penal.
Para tanto, existem dois momentos deste tipo
de crime. O primeiro realiza-se com o crime culposo ou doloso propriamente
dito, denominado fato antecedente. O segundo, que é o resultado agravador da
sanção penal, que também pode ser produzido culposa ou dolosamente, é o fato
consequente.
Existem quatro tipos de crime qualificados
pelo resultado:
a) Dolo no antecedente e
dolo no consequente: a exemplo do crime de latrocínio (CP, art. 157, §3º, in fine).
A morte que sobrevém ao roubo pode ser culposa (crime preterdoloso) ou dolosa.
b) Culpa no antecedente e
culpa no consequente: a conduta básica e o resultado agravador são previstos na forma culposa
(CP, art. 258, in fine).
c) Culpa no antecedente e
dolo no consequente: Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), art.
303, parágrafo único. O motorista culposamente dirige embriagado, mas
dolosamente foge ao atropelar uma pessoa.
d) Por fim, conhecido como crime preterdoloso (além do
dolo), a conduta antecedente dolosa e a consequente culposa, caso do roubo em
que ocorre a morte da vítima.
Calha anotar aqui a visão de Cezar Roberto
Bitencourt, que distingue os crimes preterdolosos dos crimes qualificados pelo
resultado com fundamento diverso: "no crime qualificado pelo resultado, ao
contrário do preterdoloso, o resultado ulterior, mais grave, deriva
involuntariamente da conduta criminosa, lesando um bem jurídico diverso do bem
jurídico precedentemente lesado. Assim, enquanto a lesão corporal seguida de
morte seria preterintencional (CP, art. 129, §3º), o aborto seguido da morte da
gestante seria crime qualificado pelo resultado (CP, art. 125, 126 c/c 127).
FATO TÍPICO
Para que haja crime é preciso, em primeiro
lugar, uma conduta positiva ou negativa. Mas nem todo comportamento do homem
constitui delito. Em face do princípio da reserva legal, somente os descritos
pela lei penal podem assim ser considerados. Somente o fato típico, ou seja, o
fato que se amolda ao conjunto de elementos descritivos do crime contido na
lei, é penalmente relevante.
Entende-se por fato típico o comportamento humano
(positivo ou negativo) que provoca um resultado (em regra), e é previsto em lei
penal como infração. O fato típico é composto pelos seguintes elementos:
conduta humana dolosa ou culposa; resultado; nexo de causalidade entre a
conduta e o resultado; enquadramento no fato material (conduta, resultado e
nexo) a uma norma penal incriminadora. Não basta, porém, que o fato seja típico
para que exista crime. É preciso que seja contrário ao direito, antijurídico
(análise do crime sob o aspecto formal).
Para que se chegue à conclusão de que o crime
é preterdoloso não deve haver controvérsia nos autos a respeito da presença dos
elementos do fato material: conduta, resultado e nexo de causalidade. Os pontos
a discutir residem no elemento subjetivo-normativo (dolo ou culpa) e na consequente
tipicidade (crime doloso ou preterdoloso).
A TEORIA FINALISTA DA AÇÃO
A teoria finalista da ação foi adotada pelo
nosso código na reforma de 1984, deslocando o dolo e a culpa do terreno da
culpabilidade para o campo do tipo penal. Em face disso, considerando o crime
como fato típico e antijurídico, o primeiro elemento daquele é a conduta dolosa
ou culposa, dirigida a uma finalidade. Assim, para que um fato seja típico, é
preciso que haja dolo ou culpa, sem o que não há crime.
Seguindo-se a teoria da ação finalista, para
casos de crimes preterdolosos, haverá uma decisão desclassificatória,
entendendo não haver dolo eventual no tocante ao resultado, mas a existência da
culpa consciente, caracterizando o fato como delito preterdoloso ou
preterintencional.
CRIMES PRETERDOLOSOS
O termo preterdolo emana do latim praeter
dolum, ou seja, além do dolo. Destarte, crime doloso ou preterintencional,
é o que se verifica quando a conduta dolosa acarreta a produção de um resultado
mais grave do que o desejado pelo agente.
O propósito do autor era praticar um crime doloso,
mas por culpa, sobreveio um resultado mais gravoso do que o inicialmente
pretendido. Resta caracterizada, portanto, a figura híbrida do crime
preterdoloso, com dolo no antecedente (minus delictum) e culpa no
consequente (majus delictum).
Diante no misto entre dolo e culpa, o preterdolo é
classificado como um elemento subjetivo-normativo do tipo penal, uma vez que o
dolo atinge o elemento subjetivo do agente e a culpa reside num juízo de valor,
entendido como elemento normativo.
Nos termos do CP, art. 19, o agente somente
responderá pelo resultado mais grave se a culpa for provada, se era previsível,
ainda que absoluta ou relativa. Não se admite a figura da versari in re
illicita que proclamava o brocardo: qui in re illicita
versatur tenetur etiam pro casu, ou seja, quem se envolve com coisa ilícita
é responsável também pelo resultado fortuito.
Também nos sugere Jesus (2002, v.1, p.270)
que o crime de preterdolo apresenta-se, na maioria das vezes, sobre a forma de
adequação típica de subordinação mediata (ampliada ou por extensão) o fato de
não se enquadrar imediatamente na norma penal incriminadora considerada,
necessitando para isso do concurso de outra disposição.
Ocorre
que, as vezes, o tipo se aplica a um fato sem que este contenha todos os
elementos daquele. Assim, na tentativa de homicídio por ex., o fato não se
amolda de maneira imediata no art. 121, havendo necessidade de empregar-se a
norma contida na parte geral que o descreve (art.14). Há, então, uma ampliação
temporal da figura típica, uma vez que, com o concurso de outra disposição, o
tipo não abrange somente o momento consumado do crime (morte da vítima),
estendendo-se também ao instante anterior em que a conduta se dirigia à
completa realização do modelo legal. Na participação existe ampliação espacial
e pessoal do tipo, pois a figura típica, com o concurso de regra do art. 29,
não abrange somente o comportamento que se amolda imediatamente em seu núcleo,
estendendo-se também às condutas que, de qualquer modo, concorrem para a
realização do crime.
Nos crimes preterdolosos ou
preterintencionais, não é suficiente a existência de um nexo de causalidade
objetiva entre a conduta antecedente (que constitui o primum delictum) e o resultado
agravador. Assim a relação entre a conduta e o resultado, embora necessária,
não é suficiente para o processo de adequação típica, uma vez que se exige a
relação de causalidade subjetivo-normativa, ou seja, é necessário que haja um liame
normativo entre o sujeito que pratica o primum
delictum e o resultado
qualificador. Este só é imputado ao sujeito quando previsível (culpa). Por isto
que ele é chamado preterdoloso, porque vai além do dolo.
Para Damásio E. de Jesus, em sua obra Direito
Penal, Parte Geral, 20 Ed., são preterintencionais aqueles crimes em que a ação
causa um resultado mais grave que o pretendido pelo agente.
Já Júlio Fabbrini Mirabete em seu Manual de
Direito Penal, Parte Geral arts.: 1º a 120 do Código Penal, 16 Ed., considera
os crimes preterdolosos um tipo de crime misto, pois há uma conduta dolosa que
se dirige a um fim típico, que é culposa porque causa um outro resultado que
não era objeto do crime fundamental, por inobservância do cuidado objetivo.
Temos como exemplo clássico de preterdolosos
a lesão corporal seguida de morte, em que há a conduta antecedente dolosa –
lesionar a vítima - e a consequente mais grave, culposa – a morte da mesma.
Para tal conexão entre as condutas dolosa e
culposa, respectivamente, será necessária a imputatio juris, o nexo
normativo, para que o agente responda pelo excesso em sua conduta. É
preciso que haja um liame normativo entre o sujeito que pratica oprimum
delictum e o resultado qualificador, caso contrário, seguindo o que traz
a norma penal em seu artigo 19, nada lhe poderá ser imputado, afinal, pelo
resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o tenha
causado ao menos culposamente. Nos casos de caso fortuito ou força maior o
mesmo acontece.
Outro fato que merece ressalta nos crimes preterdolosos
é que a tentativa não é punível, já que esta é impossível. Isso acontece porque
se o resultado agravador não era o pretendido pelo agente, não será possível
tentar produzi-lo. São, portanto, afastadas todas e quaisquer possibilidades da
ocorrência de tipicidade.
Entretanto,
Fernando Capez traz um exemplo em sua obra Curso de Direito Penal, Parte Geral,
Vol. 1, em que, em tese, seria possível visualizar a tentativa em Crimes
Preterdolosos. É o caso do aborto qualificado pela morte ou lesão grave da
gestante em que o feto sobrevive, mas a mãe morre ou sofre lesão corporal de
natureza grave ou gravíssima (Código Penal, art. 127). O aborto seria em tese,
tentado, e o resultado agravador culposo. Mas, mesmo dando como possível caso
de tentativa de crime preterdoloso este caso, Capez entende “que o aborto
foi consumado, ainda que não tenha havido supressão da vida intra-uterina, nos
mesmos moldes que ocorre latrocínio, quando o roubo é tentado, mas a morte
consumada”.
Nessa mesma
linha de raciocínio, para Renato Brasileiro ocorre a tentativa de crime
preterdoloso quando a tentativa recai sobre o crime antecedente, ou seja,
naquele para o qual havia a vontade (dolo) e este não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente, mas há um consequente culposo,
portanto, crime preterdoloso, é possível falar-se na tentativa.
O mesmo
professor menciona o seguinte exemplo: aborto com morte da gestante,
sobrevivendo o feto. O que restou tentado foi o dolo de praticar o aborto,
neste caso é possível a tentativa. O agente responde por aborto tentado
qualificado pelo resultado morte.
Assim conclui-se que, para que haja crime
preterdoloso devem-se observar os elementos subjetivos presentes no momento da
conduta, definindo-se se houve a ocorrência de previsão sobre o resultado e se
o agente assumiu ou não o risco de produzi-lo. Essas características irão
delimitar a possibilidade de existência do dolo eventual ou da culpa consciente
no que se refere ao resultado da conduta. A culpa consciente difere do dolo
eventual na medida em que neste o agente tolera a produção do resultado,
sendo-lhe o evento indiferente (tanto faz que ocorra ou não). Na culpa
consciente, ao contrário, o agente não quer o resultado, nem o risco lhe é
tolerante ou indiferente. O evento lhe é representado (previsto), mas confia em
sua não-produção e, apesar de sabê-la possível, acredita sinceramente poder
evitá-lo, o que só não acontece por erro de cálculo ou erro de execução.
Ainda, é importante fazer uma distinção
entre preterdolo e culpa imprópria, para que estes não se confundam. Na culpa
imprópria há culpa no antecedente e dolo no conseqüente, ao contrário do que
ocorre no preterdolo. Ela está disposta no Código Penal, art. 20, § 1º, 2ª
parte, e 23, parágrafo único. A culpa imprópria é, na realidade, culpa por
equiparação: o C.P. equipara para fins de pena o delito doloso ao culposo. É o
caso do erro de tipo inescusável (evitável, vencível) nas discriminantes
putativas, previstas no art. 20, § 1º, parte final (matar alguém, supondo
erroneamente que estava sendo atacado - legítima defesa putativa).
Salienta-se, por fim, o entendimento da
jurisprudência:
“EMENTA:
PENAL - PROCESSO PENAL -LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE - CRIME PRETERDOLOSO -
PROVA AGRESSÃO - PREVISIBILIDADE - CONCEITO DESCLASSIFICAÇÃO - PENA - REGIME
Não havendo controvérsia acerca da dinâmica do evento, ficando certo que os
acusados, unidos em um mesmo ideal, agindo em conjunto, sem o dolo de matar,
apenas de lesionar, agrediram a vítima com socos, tapas e empurrões, nela
causando lesões que foram à causa de sua morte, sendo atestado no laudo
pericial que a morte ocorreu por edema cerebral e hematoma extradural provocado
por ação contundente, devendo ser destacado que as agressões foram confirmadas
por duas testemunhas isentas, o ponto nodal deste recurso consiste na correta
tipificação da conduta respectiva. Com efeito, o delito de lesão corporal
seguido de morte constitui o chamado crime preterdoloso, havendo dolo no
antecedente e culpa no conseqüente. O agente quis apenas lesionar, não sendo o
resultado morte aceito ou querido, vindo a ocorrer por culpa, exigindo-se que o
autor obre com previsibilidade para que se lhe possa imputar a circunstância de
agravamento na reação penal. Na linha de pacífica doutrina, previsível é o fato
cuja superveniência não escapa à perspicácia comum, não se podendo afastar do
que seria imaginável pelo chamado homem médio (previsibilidade objetiva),
também se admitindo que a previsibilidade deva ser estabelecida conforme a
capacidade de previsão de cada indivíduo, sem que para isso se tenha de
recorrer a nenhum termo médio (previsibilidade subjetiva). No caso concreto, a
meu sentir, a morte da vítima era previsível nas circunstâncias em que foram
perpetradas as agressões, eis que vários foram os agentes, certo que o agredido
estava embriagado e era mais velho do que os agentes. De outro giro, apesar da
negativa de Elisangela, ela estava junto com os demais acusados, um deles seu
irmão, quando das agressões, certo que estas decorreram da discussão que ela
tivera com a vítima por força de anterior entrevero desta com sua filha. Prova
suficiente para que seja reconhecido o crime de lesão corporal seguida de
morte, apenas devendo ser afastada a agravante requerida na denúncia. Pena que
deve ser fixada no mínimo legal. O regime aberto se mostra o adequado e
proporcional, não sendo possível a substituição da PPL por PRD em razão do
crime ter sido praticado com violência contra a pessoa.” (TJ-RJ - APL:
00030234220088190042 RJ 0003023-42.2008.8.19.0042, Relator: DES. MARCUS
HENRIQUE PINTO BASILIO, Data de Julgamento: 22/05/2012, PRIMEIRA CAMARA
CRIMINAL, Data de Publicação: 22/08/2012 18:10).
“APELAÇAO
CRIMINAL. PROCESSO PENAL. LESAO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. PROVAS SUFICIENTES
PARA A CONDENAÇAO. NEXO CAUSAL ENTRE A AÇAO DOLOSA E O RESULTADO MORTE CULPOSA.
CRIME PRETERDOLOSO. DOLO NO ANTECEDENTE E CULPA NO CONSEQUENTE. RECURSO
CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. As provas comprovam de forma indubitável a autoria e
materialidade delitiva. 2. Nexo causal entre a conduta do réu (desferimento da
facada na região do pescoço) e a morte da vítima após uma semana. 3. Crime
preterdoloso, ou seja, dolo na deflagração do ferimento (animus laesendi) e
culpa no resultado morte. 4. Recurso conhecido e improvido.”(TJ-PI - ACR:
201000010053551 PI , Relator: Des. Sebastião Ribeiro Martins, Data de
Julgamento: 30/11/2010, 2a. Câmara Especializada Criminal).
“PROCESSO
PENAL. PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DO FEITO. REJEITADA.
AUSÊNCIA DA DEMONSTRAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR
AUSÊNCIA DE PROVAS DA CONDUTA DOLOSA. NÃO ACOLHIMENTO. A AUSÊNCIA DE DOLO DO
AGENTE, POR SI SÓ, NÃO IMPLICA JUÍZO ABSOLUTÓRIO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE
DESCLASSIFICAÇÃO DA AÇÃO DA RÉ. CONDENAÇÃO PELO CRIME DE LESÃO CORPORAL SEGUIDA
DE MORTE. ACÓRDAO ANTERIOR DA CÂMARA CRIMINAL AFIRMANDO QUE CONDUTA FOI
PRETERDOLOSA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. AÇÃO PERPETRADA QUE ASSUMIU O RISCO DE
CAUSAR LESÃO AINDA QUE MAIS GRAVE NA VÍTIMA. DOLO EVENTUAL CARACTERIZADO.
RESULTADO MORTE INIMAGINADO, IMPREVISTO E NÃO DESEJADO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE
QUE SERIA POSSÍVEL AFERIR TER PRODUZIDO O RESULTADO ALCANÇADO. AFASTAMENTO DA
CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 129, § 7º DO CP. REDIMENSIONAMENTO DA PENA.
01 – Em matéria processual penal, as nulidades são
regidas pela ideia do prejuízo, consoante se infere da leitura do artigo 563 do
Código de Processo Penal, cuja não caracterização implica a inexistência dos
supostos vícios, merecendo o ato processual ser preservado. 02 – Mesmo na hipótese de uma
conduta da agente contida em um tipo penal não incriminador não ter sido
motivada pelo dolo – vontade
consciente dirigida a realizar (ou aceitar realizar) –, tal circunstância, por si
só, não autoriza um julgamento absolutório, em razão da ausência de provas da voluntariedade de sua
conduta, pois, ainda assim, a ação praticada poderia se amoldar à modalidade
culposa de crime, o que não a isenta de responsabilidade. 03 – Reconhece-se o dolo eventual na conduta que
assume o risco de produzir um resultado, imaginado, previsível e possivelmente
alcançado pelo íntimo subjetivo do agente. 04 – Assumindo o risco de produzir a lesão corporal com a manobra, a ocorrência do resultado morte se deu na forma
culposa, caracterizando o crime preterdoloso previsto no art. 129, § 3º do
Código Penal. 05 – Deve haver
o redimensionamento da pena, para o afastamento da causa de aumento prevista no
art. 129, § 7º do Código Penal,
quando não for possível concluir que a conduta da agente presumia
que estava causando resultado em alguém, mas
restar patente que apenas seu anseio era o de se livrar do aparente e
imaginável perigo. 06 – De acordo
com o art. 33, § 2º, alínea b do Código Penal, não havendo a
predominância de
circunstâncias
judiciais do art. 59 do Código Penal
em grau violento, bem como estando a pena no patamar ente 04 (quatro) e 08
(oito) anos de reclusão e não sendo a ré reincidente, é plenamente aceitável a
fixação de regime inicial para o cumprimento da pena semiaberto. RECURSO
CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.”(TJ-AL - APL:
00204141520058020001 AL 0020414-15.2005.8.02.0001, Relator: Des. Fernando
Tourinho de Omena Souza, Data de Julgamento: 11/12/2013, Câmara Criminal, Data
de Publicação: 12/12/2013).
“APELAÇÃO
CRIMINAL. Lesão corporal seguida de morte. Sentença condenatória. Defesa
pretende a absolvição sob a alegação de legítima defesa. - Incabível. Autoria e
materialidade demonstradas nos autos. Testemunhas presenciaram o réu desferir
golpe com cabo de vassoura na vitima. Laudo de exame necroscópico atestou que a
morte se deu por traumatismo crânio encefálico. Não configurada a excludente de
legítima defesa, nem real e nem putativa ou imaginária. Ausentes os requisitos
legais. Típico caso de crime preterdoloso. Houve dolo no fato antecedente e
culpa no consequente. Condenação mantida. Pena bem dosada. Regime prisional
adequado. - Apelo não provido.” (TJ-SP - APL: 00194972520118260451 SP
0019497-25.2011.8.26.0451, Relator: Péricles Piza, Data de Julgamento:
09/03/2015, 1ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 12/03/2015).
“Apelação.
Lesão Corporal qualificada pelo resultado. Crime preterdoloso. Dolo eventual e
culpa. Emprego de arma de fogo. Inteligência do art. 209, § 3º, do CPM.O
Apelado assumiu o risco de produzir lesão na vítima, embora o resultado grave
que veio a ocorrer não fosse pretendido ou esperado.A Ação ilícita resultou em
lesão corporal, com efeitos permanentes, praticada com dolo eventual, tendo a
gravidade do resultado não desejado culminado com o "preterdolo".A
caracterização do elemento subjetivo impõe a distinção entre o dolo na conduta
antecedente e culpa no consequente resultado, integrados em uma única figura
típica: a lesão corporal qualificada, descrita na figura típica do crime
preterdoloso - art. 209, § 3º, do CPM.Apelo Ministerial parcialmente
provido.Decisão por maioria.Declarada extinta a punibilidade pela prescrição da
pretensão punitiva retroativa.Decisão unânime.”(STM - AP: 346120057010201 RJ
0000034-61.2005.7.01.0201, Relator: Renaldo Quintas Magioli, Data de
Julgamento: 20/05/2010, Data de Publicação: 17/11/2010 Vol: Veículo: DJE).
CONCLUSÃO
Portanto, para que um delito seja considerado
preterdoloso é preciso que o agente dirija sua conduta a uma intenção inicial (primum delictum), agindo dolosamente
em relação a esta; e tenha como resultado algo mais grave que o pretendido pelo
sujeito (resultado qualificador) atribuindo-se a este último a culpa
consciente, pois o agente, tendo previsto o resultado no momento de sua
conduta, acreditava sinceramente poder impedi-lo, ocorrendo aqui excesso de
confiança e erro de execução. É a chamada “preterintencionalidade
substitutiva”. O agente quer um minus e seu comportamento causa um majus, de maneira que se
conjugam o dolo na conduta antecedente e a culpa no resultado (conseqüente).
Daí falar-se que o crime preterdoloso é um misto de dolo e culpa: dolo no
antecedente e culpa no conseqüente.
É importante ampliar-se o estudo acerca desse
tema, pois, como já fora mencionado, envolve espécies bastante subjetivas do
crime, as quais não são fáceis de se analisar. A desclassificação da tipicidade
(de dolo eventual para preterdolo) terá grande repercussão no que diz respeito
às penas aplicadas, que possuem diferença de tempo relativamente significante. Se
há possibilidade do delito ser tipificado no plano do preterdolo, é relevante
que haja um grande esforço, por parte da defesa, para que se faça sobressair
esta tese, pois estaríamos diante de uma das circunstâncias mais relevantes aos
seres humanos, contemplada até mesmo pela Declaração Universal dos Direitos
Humanos e em nossa Constituição Federal: a liberdade, fundamento que dá ânimo à
vida e à perspectiva de um futuro próspero ao réu, que ao ser privado da
liberdade, depois de julgado, o seja por tempo justo e próprio do crime
cometido, e não por um demasiadamente prolongado, por imprudência ou imperícia
da defesa ou incompreensão dos julgadores.
Por: Ana Caroline Cremasco Dalbon
Clarissa S. Lara
Diego Sanches Russo
Edmar W. Barbosa Nery
Referências Bibliográficas
- COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Curso
de Direito Penal, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 1991.
- JESUS, Damásio E. de. Direito
Penal, Parte Geral. 25ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
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