1.Introdução
Partindo
do principio de que o legislador quando promoveu as alterações nos crimes
contra a dignidade sexual (Lei nº 12.015/2009), teve o intuito de trazer
melhoras, vale salientar que mesmo realmente havendo benefícios a nova lei
acabou deixando lacunas e divergências quanto a eficaz aplicação e
especialmente quanto o procedimento para ingresso a ação penal, quando o
legislador pensou no resguardo a intimidade da vitima em prejuízo da
perseguição obrigatória ao sujeito ativo.
O
Código Penal Brasileiro atual em seu art. 213 e seguintes, mostra as
possibilidade em que o agente pratica crime contra a dignidade sexual e a pena
aplicada a este, tendo em vista o Principio da Legalidade.
O
legislador, reconhecendo a importância do bem jurídico tutelado, resolveu
dedicar um titulo único para descrever os crimes contra a dignidade sexual, com
a intenção de reprimir de maneira mais eficaz tais condutas.
2. Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual
2.1 Surgimento
Os
crimes contra a Dignidade Sexual teve surgimento pela necessidade de se
proteger à moral e os bons costumes com normas incriminadoras. Normas estas que
foram desenvolvidas para promover o bom convívio entre a sociedade. Em 1940
pelo ponto de vista repressivo do Código Penal, surgiu a perspectiva da punição
pelo Estado para o individuo que violasse tal direito.
Nesse
ponto de vista o doutrinador Edgard Magalhães Noronha:
“Nada perderia a lei se utilizasse o Titulo “Crime
contra o Pudor”, tendo em vista que todos os delitos que compuseram esse Titulo
tiveram como denominador comum, a ofensa a esse sentimento individual e social,
além de que essa expressão estaria mais ao alcance do povo por ser o pudor vulgarmente
conhecido como sentimento de pejo ou vergonha suscitado por um ato de natureza
sexual”.
Mas
independente do titulo, o bem jurídico tutelado pela lei, primordialmente seria
a dignidade da pessoa humana, que com amparo constitucional, o legislador
tratou de forma especifica os crimes contra dignidade sexual por conta de sua
importância.
Alguns
doutrinadores defendem que, “o vértice interpretativo deve atentar sobre a
existência de lesão ou perigo a dignidade sexual dos envolvidos e não ao
sentimento social sobre os fatos”, como Gustavo Octaviano Diniz Junqueira no
livro “Elementos do Direito Penal” (p. 263), porém isso não é absoluta verdade.
Esta
posição é discutível como demonstram pesquisas realizadas sobre o perigo que
causa o sujeito ativo envolvido em tais crimes e, por isso o risco em que é
colocada a sociedade que em respeito a intimidade da vitima, esse individuo
fiquei livre para reincidir.
Ainda,
é valido salientar, que a lei surge juntamente com as mudanças sociais e pelas
necessidades apresentadas, como consequência disto, não se pode interpretar a
norma, especialmente de ordem publica, com o pensamento voltado somente aos
envolvidos direto com o delito.
2.1.1 Mudanças trazidas pela Lei 12.015/2009
Sobre
o crime de estupro, previsto no artigo 213 do CP, o legislador abrangeu a sua
aplicação, dando a possibilidade de não só a mulher, mas também o homem ser
sujeito passivo do crime.
Com
tal mudança, o atentado violento ao pudor deixou de ser considerado um tipo
penal se integrando no mesmo artigo, não acontecendo, “abolitio criminis”, e sim a modificação de duas condutas antes
diferentes em um único crime, o que veio a beneficiar vários indivíduos que
respondiam por concurso de crimes e que agora tem a pena reduzida por se
caracterizar um crime único.
Com
o objetivo de tornar a lei mais severa, também tornou o crime de estupro de vulnerável
como um crime hediondo, como já previsto nos casos de crime de estupro do
artigo 213 do CP, revogou os casos que presumiam a violência do artigo 224 do CP,
aumentando as penas de crimes sexuais contra adolescentes maiores de 14 e
menores de 18 anos, ou ainda, quando for caso de lesão corporal de natureza
grave.
As
alterações geraram uma série de criticas, neste interim expõe o doutrinador
Gustavo Octaviano Diniz Junqueira:
“A lei 12.015/2009, além
do nome do Título, mudou a estrutura dos crimes e gerou celeuma pela falta de
clareza de seus tipos.” (“Elementos do Direito Penal” – p. 263).
Assim, embora a lei tenha proporcionado mudanças, existem
divergências no sentido de que elas não atenderam totalmente as necessidades da
sociedade, ou seja, com relação ao principio da proporcionalidade, a lei não
supriu a precisão da severa punição que tal fato pede.
2.1.2 Sujeito Ativo dos Crimes Contra
Dignidade Sexual
Segundo a maior parte da doutrina, o agente que comete
crime contra a dignidade sexual, onde viola a intimidade da vítima e a moral da
sociedade, tem grandes chances de voltar a cometer tais atos, gerando
insegurança na sociedade, pois estando o individuo solto, poderá este fazer uma
próxima vítima que pode ser qualquer pessoa.
Acontece que na grande maioria dos casos, a vitimas não
apresentam a queixa-crime, não movendo ação penal privada afim de aplicar a
punição ao individuo, por que querem resguardar a sua intimidade e segurança.
Mesmo atualmente modificado pela lei, exigindo apenas à representação da vítima
para que seja dado inicio a ação penal, acaba por deixar as mãos da vitima a
possibilidade de punir o agente.
O autor de crimes sexuais, sendo um perigo a sociedade,
não pode o Estado deixar nas mãos da vitima a decisão de punir ou não o
individuo que cometeu tal crime, deixando o Ministério Público, dependente da
representação da vitima para processar o criminoso, que na maioria dos casos
voltará a delinquir.
Assim sendo, a persecução e punição do
autor de crimes contra a dignidade sexual, refletem, diretamente na sociedade,
tendo em mente a possibilidade de reincidência, que vem atingir a segurança
social, sendo a prisão dos agentes, medida de efetiva resposta a uma
coletividade e imprescindível para manter a ordem pública.
3.
Da Ação Penal Nos Crimes Contra a Dignidade Sexual
3.1
Mudanças da Lei
Antes deste marco legislativo, os então chamados crimes contra os
costumes estavam submetidos, em regra, à ação penal privada. Excepcionalmente é
que tais crimes seriam de ação penal pública, ora incondicionada – se o crime
fosse cometido com abuso do pátrio poder -, ora condicionada à representação do
ofendido.
A ação passou a ser pública condicionada à
representação, tendo a legitimidade ativa passado ao Ministério Público, porém,
ele necessita da representação da vítima para iniciar a persecução penal.
Embora
o Ministério Público tenha atualmente a titularidade da ação em qualquer das
hipóteses previstas nos crimes contra a dignidade sexual, a condição à que ele
fica submetido, ou seja, a representação do ofendido, acaba, em várias
oportunidades, por gerar a impunidade do indivíduo que cometeu o delito.
Com
relação à exceção prevista no parágrafo único do artigo 225 do CP,
anteriormente só havia previsão quanto à ação penal condicionada nos casos em
que a vítima era pobre, e apenas incondicionada se o crime era cometido com
abuso do poder familiar, ou com violência real, de acordo com a Súmula 608 do
STF. A nova lei 12.015/2009, no entanto, também tratou de alterar a exceção,
tendo em vista que, atualmente, o parágrafo único do artigo 225 do CP tem a
seguinte redação:
Procede-se, entretanto,
mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito)
anos ou pessoa vulnerável”
Ou
seja, a lei teria a intenção de proteger as vítimas que fossem menores de
idade, bem como as vulneráveis, tendo em vista a maior fragilidade dessas pessoas.
Essa atenção do legislador deveria abranger não somente a estas vítimas,
mas sim, a todas as vítimas dos crimes contra a dignidade sexual, assegurando,
assim, a segurança de toda a comunidade, tendo em vista a gravidade do delito e
a periculosidade do sujeito que o pratica.
4. Princípio Da Proporcionalidade
4.1 Conceito
Ao buscarmos a palavra Proporcional no dicionário encontramos a seguinte definição: “em
que há proporção correta, equilíbrio, harmonia.” (HOUSSAIS, 2001, p. 2313).
Assim, o Princípio Constitucional da Proporcionalidade é utilizado como uma
ponderação harmoniosa quando há colisão de direitos fundamentais, sejam eles de
1ª, 2ª ou 3ª geração, individuais ou coletivos. Afinal, sabe-se que os direitos
fundamentais não são ilimitados ou absolutos, encontrando seus limites em
outros direitos, também fundamentais.
Poderá
em certos casos ter maior peso a honra e a vida privada e, em outros, a
liberdade de expressão por exemplo. Sendo assim, não há como saber qual sempre
prevalecerá, pois somente diante de um caso concreto, de uma hipótese fática e
real é que se poderá decidir.
4.2 A Segurança Coletiva e a Intimidade
da vítima
O
artigo 5°da Constituição Federal de 1988, resguarda em seu “caput” os cinco
direitos fundamentais: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” (art. 5°, “caput”, CF/88).
Em
relação ao direito fundamental segurança, deve-se considerar que “é um direito
de personalidade, inerente à necessidade de se desenvolverem as atividades por
onde se expressa o modo de ser de cada um no mundo, sem que elas venham a ser
objeto da arbitrária interferência de quem quer que seja”. (CHAVES, 1982, p.
497).
Sobre
o outro direito fundamental, o direito de inviolabilidade da intimidade, da
vida privada, da honra e da imagem das pessoas, previsto no artigo 5°, inciso X
da Constituição Federal, a lei determina que: “São invioláveis a intimidade, a
vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
A
razão de haver colisões entre direitos fundamentais, está ligada ao fato de que
os direitos fundamentais não são absolutos ou mesmo ilimitados. A grande
maioria da doutrina defende que, no caso dos crimes contra a liberdade sexual,
a vítima sofreria ainda mais com a propositura da ação, mas, em detrimento
disto, se esquecem que a sociedade sofre as consequências da não punição do
agente infrator.
É
necessário, portanto, que se pondere a situação, os direitos e os interesses em
jogo. Desta forma surge o Princípio da Proporcionalidade no conflito entre
Direito à Intimidade da Vítima e Direito à Segurança de toda sociedade. “O
princípio da proporcionalidade exige que se faça uma ponderação sobre a relação
existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato), e
o bem de que pode alguém ser privado (gravidade da pena)”. (LOPES, 1999, p.
473).
5.Conclusão
Mesmo a Lei 12.015/2009 tendo surgido
para suprir as necessidades da sociedade, dando plenos direitos e deveres, para
que possa ser resguardada as garantias fundamentais, não se pode afirmar que a
lei atingiu seus objetivos, seja em um aspecto de severidade ou modificação do
tipo de ação penal imposta.
Com a realização de estudos mais
aprofundados sobre as mudanças trazidas pela nova lei, discute-se a modificação
de alguns artigos podendo resguardar a intenção do legislador, ou seja, a
proteção da sociedade e das vitimas deste tipo penal.
O principio da proporcionalidade tem
por finalidade fazer aplicar-se o direito que for mais necessário e importante
em conflito, sendo neste caso o direito da sociedade como um todo, devendo-se
interpretar a norma de forma que favoreça interesses coletivos não somente os
individuais, posto que se encontram aparentemente em conflito.
Vale ressaltar, que embora as
interpretações a respeito de citada lei sejam divergentes, ela surgiu pelas
necessidade e modificações da sociedade e vem para amparar e resguardar sua
efetiva aplicabilidade.
Não pode-se permitir a impunidade de
criminosos dessa espécie por conta da privacidade ou intimidade da vitima, ou
ainda fechar os olhos para o perigo da reincidência desses infratores
cometedores de crimes contra a dignidade sexual, fundados no fato de que a
persecução penal trará maiores prejuízos a vítima.
Em nome do direito da
proporcionalidade, a sociedade tem o direito de ver longe do convívio social os
delinquentes de crimes contra a dignidade sexual, pois esse direito deve se
sobrepor ao interesse privado da intimidade da vitima.
Mesmo que a ação penal cause
realmente constrangimento à vitima, não seria motivo suficiente para ser
concedida a ela a opção de escolher se o Estado deve ou não punir esses
criminosos, visto que o perigo e repugnância dos crimes que eles cometeram, já
servem como base para a necessidade da persecução criminal ser incondicional
delegada ao Estado que como representante da sociedade, busca punir os
cometedores destes crimes.
Por: Alba Carolina da Silva
Ana Carolina de Mello Maldonado
Amanda Ap Dias Nogueira
Beatriz Pereira de Carvalho
Ana Carolina de Mello Maldonado
Amanda Ap Dias Nogueira
Beatriz Pereira de Carvalho
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BRASIL.
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Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual – Comentários à lei
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José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada. Belo Horizonte: Del
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STEINMETZ,
Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e Princípio da
Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
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