1
- INTRODUÇÃO
A vida em sociedade, por vezes, cria
alguns conflitos entre as pessoas e põe em risco a estabilidade do convívio
social. O Direito tem a função de regular a sociedade e buscar resolver, ou se
possível evitar, esses conflitos. Para isso o Direito vale-se de uma
sistemática de normas que disciplinam a vida social.
Um dos fins dessa sistemática de normas
disciplinadoras trazidas pelo Direito é proteger uma série de bens jurídicos
que são considerados importantes para o convívio social, como por exemplo, a
vida, a saúde, a integridade física, a propriedade e etc.
O Direito Penal é o ramo do Direito que
determina os bens jurídicos a serem protegidos por sua sistemática de leis,
como o Código Penal e as leis extravagantes. A conduta humana que fere ou
coloca em risco algum desses bens jurídicos é classificada como crime e como
consequência ou repreensão por essa conduta existe uma pena.
Como exemplo de uma proteção feita pelo
Direito Penal tem-se o art. 129 do Código Penal, que traz a tipificação do
crime de lesão corporal. Essa tipificação visa proteger um bem jurídico
considerado importante para a sociedade: a integridade corporal.
Este trabalho tem como objetivo geral
analisar o art. 129 do Código Penal Brasileiro, o crime lesões corporais. Para
tanto buscou-se conceituar o crime de lesão corporal, apontar os seus sujeitos
ativo e passivo, apontar também os seus elementos objetivo e subjetivo e,
ainda, explicar as diversas modalidades dolosas e culposas de lesão corporal.
Usou-se para a produção teórica desse trabalho pesquisas de revisão
bibliográfica e debate em grupo tendo como ferramentas livros, revistas,
legislação e artigos científicos disponíveis na rede de computadores.
2- LESÕES CORPORAIS
2.1 Conceito e classificação
Sob o ponto de vista de Mirabete (2012,
p. 69) “o delito de lesão corporal pode ser conceituado como a ofensa à
integridade corporal ou à saúde”. O conceito de lesão corporal como se vê deve
ser entendido não apenas como uma lesão física ao corpo, mas toda e qualquer
ofensa que prejudique a integridade física ou psíquica, incluindo, assim,
qualquer distúrbio à saúde do ofendido. Nesse sentido, Cláudia Fernandes dos
Santos diz que:
O
conceito adotado pelo Código Penal de lesão corporal é lato sensu: lesão corporal
é todo e qualquer dano ocasionado à normalidade funcional do corpo humano, quer
do ponto de vista
No que tange a classificação, Damásio
de Jesus (2012) classifica o crime de lesões corporais como sendo crime de
forma livre, pois pode ser cometido por qualquer meio; crime material, de
comportamento e de resultado; crime de dano, pois se consuma com a efetiva
lesão ao bem jurídico tutelado e também é crime plurisubistente, pois é um
crime constituído de vários atos. Além disso, o crime de lesões corporais é
crime uni subjetivo, pois pode ser cometido por apenas uma pessoa.
2.2 Sujeitos ativo e sujeito passivo
Em linhas gerais, sujeito ativo de um
crime é o indivíduo que o pratica e o sujeito passivo é a vítima da ação
delituosa. O crime de lesões corporais não é um crime próprio (JESUS, 2012),
diante disso ele pode ser cometido por qualquer pessoa e sua vítima também pode
ser qualquer pessoa. Damásio de Jesus ensina que em se tratando do sujeito
“qualquer um pode ser ofendido, salvo nas hipóteses do art. 129, §§ 1°, IV e
2°, V, em que deve ser mulher grávida.” (JESUS, 2012, p. 163). Fora dessas
hipóteses o sujeito passivo pode ser qualquer pessoa.
2.3 Tipos objetivo e tipo subjetivo
Em linhas gerais tipo objetivo de um
crime é aquela conduta, o verbo, que quando pratico caracteriza o crime. Muitos
doutrinadores chamam de núcleo do tipo.
O núcleo do tipo legal do art. 129
é ofender. Ofender a integridade corporal ou a saúde de
outrem. Ensina o professor Julio Fabbrini Mirabete que:
O
núcleo do tipo é ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem,
incluindo, pois toda conduta que causar mal físico, fisiológico ou psíquico à
vítima. A ofensa pode causar um dano anatômico interno ou externo (ferimentos,
equimoses, hematomas, fraturas, luxações, mutilações). (MIRABETE, 2012, p. 71).
Cezar Roberto Bitencourt diz que:
A conduta típica do crime de
lesão corporal consiste em ofender, isto é, lesar, ferir
a integridade corporal ou a saúde de outrem. Ofensa à
integridade corporal compreende a alteração, anatômica ou
funcional, interna ou externa, do corpo humano, como, por exemplo, equimoses,
luxações, mutilações, fraturas etc. (BITENCOURT, 2015, p. 197, grifos do
autor).
Em síntese a lesão corporal pode
caracterizar-se por uma lesão à integridade do corporal ou da saúde do
ofendido. A lesão à integridade corporal é toda aquela que lhe cause alteração,
seja ela anatômica ou funcional, como, por exemplo, uma mutilação ou uma
fratura. Vale lembrar, ainda que o sujeito ativo produza diversas lesões no
sujeito passivo ele responde por delito único, mesmo que cause equimoses,
contusões e outras fraturas (JESUS, 2012). Diz-se alteração anatômica aquela
que deforma o corpo como a mutilação. Considera-se alteração funcional aquela
que prejudica alguma função do corpo humano como, por exemplo, a fratura de um
braço que prejudica a função desse membro. A lesão à saúde de outrem se
caracteriza por toda ou qualquer alteração fisiológica do organismo ou
perturbação psíquica do ofendido.
Já se tratando de tipo subjetivo
deve-se lembrar da intenção do agente ao praticar o tipo objetivo. Na maioria
das vezes irá aparecer como o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de
praticar a conduta descrita no tipo objetivo do núcleo. Alguns doutrinadores
usam o termo elemento subjetivo e outros usam o termo elemento subjetivo do
tipo, ambos significam a mesma coisa: a intenção do agente.
No crime de lesões corporais, segundo
Cezar Roberto Bitencourt:
O elemento
subjetivo do crime de lesões corporais é representado pelo dolo,
que consiste na vontade livre e consciente de ofender a integridade física ou a
saúde de outrem. É insuficiente que a ação causal seja voluntária, pois no
próprio crime culposo, de regra, a ação também é voluntária. É
necessário, com efeito, o animus laedendi. (BITENCOURT, 2015, 199,
grifos do autor).
Em consonância com Cezar Roberto
Bitencourt cita-se Ney Moura Teles. Para Teles:
O animus
laedendi ou animus nocendi é o elemento subjetivo
integrante do tipo legal do crime de lesão corporal. É a consciência do fato de
que sua conduta poderá produzir a lesão à integridade ou o dano à saúde do
outro ser humano, e a vontade livre de realizá-la com o fim de produzir esse
resultado. (TELES, 2006, p. 5).
Para Julio Fabbrini Mirabete:
O dolo do crime de
lesões corporais é a vontade de produzir um dano ao corpo ou à saúde de outrem
ou, pelo menos, de assumir o risco desse resultado. É o denominado animus
laedendi ou nocendi, que diferencia o delito de lesão
corporal da tentiva de homicídio, em que existe a vontade de matar (animus
necandi). (MIRABETE, 2012, p. 72).
Mirabete traz a questão da
diferenciação entre a lesão corporal e a tentativa de homicídio. Segundo ele a
diferença consiste no elemento subjetivo visto que no crime de lesões corporais
o agente tem a intenção de apenas ferir a vitima (animus laedendi),
causar-lhe uma lesão corporal, enquanto que na tentativa de homicídio a
intenção, ou o elemento subjetivo ou tipo objetivo da conduta, é matar a vítima
(animus necandi), mas por circunstâncias alheias a sua vontade não
consegue consumar o crime de homicídio.
Sob outro ponto de vista acerca do
elemento subjetivo do tipo no crime de lesões corporais vale o ensino de
Damásio de Jesus, que diz:
O crime de lesão
corporal admite dolo, culpa e preterdolo. Como vimos, o tipo doloso é previsto
na figura fundamental (CP, art. 129, caput). As formas culposas
estão previstas nos §§ 6º e 7º.O primeiro prevê a lesão corporal culposa
simples; o segundo, a lesão corporal culposa qualificada. O preterdolo é
admitido nas formas qualificadas dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129. Nesses casos o
delito fundamental é punido a título de dolo, enquanto o resultado
qualificador, a título de culpa. (JESUS, 2012, p. 166).
Damásio de Jesus traz o dolo, a culpa
e, ainda, o preterdolo como elementos subjetivos do tipo no crime de lesões
corporais mudando de pensamento em relação a BITTENCOURT (2015), TELES (2006) e
MIRABETE (2012) que trazem apenas o dolo como elemento subjetivo do crime de
lesões corporais.
2.4 Exclusão do crime
A exclusão do crime de lesões corporais
em certas práticas gira em torno da disponibilidade ou indisponibilidade da
integridade corporal da pessoa. Cezar Roberto Bitencourt diz que:
Heleno Cláudio
Fragoso, simpatizando com disponibilidade da integridade corporal, sustentava
que o consentimento do ofendido, validamente obtido, exclui a
ilicitude e que é com base nesse consentimento que se afasta a antijuridicidade
da extração de órgãos de pessoas vivas para transplantes. (BITENCOURT, 2015, p.
197).
Cezar Roberto Bitencourt expõe seu
posicionamento doutrinário, dizendo que:
[...] no
ordenamento jurídico brasileiro, a integridade física apresenta-se como relativamente
disponível, desde que não afronte interesses maiores e não ofenda os
bons costumes, de tal sorte que as pequenas lesões podem ser livremente
consentidas, como ocorre, por exemplo, com as perfurações do corpo para a
colocação de adereços. (BITENCOURT, 2015, p. 197).
Mirabete a situação da cirurgia de
remoção de órgãos genitais externos de transexual.
2.5 Consumação e tentativa
Há consumação do delito, quando
acontece uma lesão à integridade física ou mental da vítima. No caso da
tentativa já admitiu-se a inadmissibilidade da conduta uma vez que a prática
coincide com a contravenção de vias de fato. Segundo Murilo Cézar Antonini
Pereira “Entende-se por contravenção de vias de fato a infração penal
expressamente subsidiária, em que o autor emprega violência contra determinada
pessoa sem causar lesões corporais ou morte.” (PEREIRA, 2014). No entanto, a
tentativa de lesões corporais é admitida, conforme explica Mirabete:
Já se entendeu que
‘é juridicamente impossível a tentativa de lesões corporais porque tal figura,
coincidindo inteiramente à definição de vias de fato, não passa desse modesto
ilícito’. Tal orientação, contudo, é isolada, opinando a doutrina pela
possibilidade da tentativa, indiscutível quando o agente, pretendendo causar um
ferimento ou dano à saúde, não consegue por circunstâncias alheias a sua
vontade. (MIRABETE, 2012, p. 73).
Alerta Mirabete (2012), que a
dificuldade de prova não serve de obstáculo à conclusão a favor da
possibilidade de tentativa de lesões corporais. Concordando com Fabbrini
Mirabete Damásio de Jesus diz que na hipótese de dúvida “o juiz deve aplicar o
princípio do in dubio pro reo, condenando-o por tentativa de lesão
corporal leve” (JESUS, 2012, p. 166).
Entretanto, Rogério Greco diz o
seguinte:
No que diz respeito
à tentativa, ela será perfeitamente admissível na hipótese de lesão corporal
leve. Sendo graves ou gravíssimas as lesões, somente se admitirá a tentativa
nos casos em que o delito não for classificado como preterdoloso. Assim,
portanto, não há que se falar em tentativa nas hipóteses de lesão corporal
qualificada pelo: 1) perigo de vida; 2) aceleração de parto; 3) aborto. Da
mesma forma, não se admitirá a tentativa no delito de lesão corporal seguida de
morte, em face da sua natureza preterdolosa. (GRECO, 2012, p. 279, grifos do
autor).
Rogério Greco, então, aborda o
preterdolo do agente na inadimissibilidade da tentativa no crime de lesões
corporais, sendo, portanto, admissível plenamente a tentativa no crime de
lesões corporais leves, onde não há o preterdolo.
2.6 Lesão corporal leve
A lesão corporal de natureza leve está
descrita no art. 129, caput, do Código Penal. Segundo Julio
Fabbrine Mirabete:
O conceito de lesão
leve é dado por exclusão. Prevendo o art. 129, nos §§ 1º, 2º e 3º, os crimes de
lesões graves, gravíssimas e seguidas de morte, configuram o tipo básico,
no caput, as lesões que não causarem qualquer dos resultados
mencionados nos citados parágrafos. (MIRABETE, 2012, p. 74)
Em consonância com MIRABETE (2012),
Damásio de Jesus diz que:
Para saber se um
crime de lesão corporal é de natureza leve, grave ou gravíssima, devemos
empregar o critério da exclusão. Há delito de lesão corporal leve sempre que o
fato não se enquadra na descrição do art. 129, §§ 1º e 2º, que definem as
lesões graves e gravíssimas. (JESUS, 2012, p. 168).
As lesões corporais leves são de
competência dos Juizados Especiais. Devido ao seu menor caráter ofensivo.
Dependem, porém, de representação do ofendido, conforme o art. 88, da Lei n.
9.099, de 26 de setembro de 1995, segundo o artigo: “além das hipóteses do
Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal
relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas”.
2.7 Lesão corporal grave
No código Penal as lesões corporais de
natureza grave estão descritas nos §§ 1º e 2º do art. 129. Em sentido estrito
as lesões corporais graves são as descritas no § 1° do art. 129 (JESUS, 2012) e
estão elencadas nos incisos I a IV, conforme será discutido.
2.7.1 Incapacidade para as ocupações
habituais por mais de trinta dias
A primeira das lesões corporais graves
descritas no Código Penal e a incapacidade para as ocupações habituais por mais
de trinta dias, tratado no art. 129, § 1°, I. Segundo Julio Fabbrini Mirabete:
A referência à
ocupação habitual não tem o mesmo sentido de trabalho diário, como previsto na
lei anterior. Por ocupações habituais não se deve entender apenas as de
natureza executiva e econômica. [...] É pacífico que as ocupações habituais
abrangem a freqüência à escola, passeios etc., incluindo as crianças e o débil
mental que não exerce atividade remunerada. (MIRABETE, 2012, p. 75).
Portanto, aquele que pratica lesão
corporal grave em um sujeito e este deixa de frequentar a escola ou o trabalho
por mais de 30 dias pratica a conduta descrita no art. 129, § 1°, I.
Mirabete ainda diz que “Nos termos do
art. 168 e parágrafos do CPP, a gravidade da lesão deve ser comprovada por
exame complementar a ser realizado no dia seguinte ao 30° da data do fato,
contando-se do dia do início por se tratar de prazo de direito penal.”
(MIRABETE, 2012, p. 75).
2.7.2 Perigo de vida
A lesão corporal que traga perigo de
vida à vítima enquadra-se como lesão corporal grave. Essa hipótese está
tipificada no art. 129, § 1°, II.
Apesar de toda lesão corporal
apresentar certo perigo de vida à vítima, Mirabete (2012) explica que a lei
penal refere-se a um perigo de vida efetivo, concreto que foi constatado em
perícia. Damásio de Jesus diz que;
Não se trata de
perigo presumido, mas concreto, precisando ser investigado e comprovado por
perícia. Os peritos não devem fazer prognóstico, mas diagnóstico,
manifestando-se sobre sua existência em qualquer momento, desde a produção de
lesão corporal até o instante do exame. O êxito letal deve ser provável e não
meramente possível. (JESUS, 2012, p. 171).
Nota-se que a lesão corporal para se
tornar grave em virtude do perigo de vida deve ser bem fundamentada.
2.7.3 Debilidade permanente de membro,
sentido ou função
No art. 129, § 1°, III, está tipificado
o crime de lesão corporal grave em virtude de debilidade permanente de membro,
sentido ou função.
Segundo Damásio (2012, p. 172),
“Debilidade é a diminuição da capacidade funcional. Exige o CP que seja
permanente. Permanência, entretanto, não significa perpetuidade. Basta que seja
duradoura.”
Sobre membro, sentido ou função, de
acordo com Mirabete:
Membros são os
apêndices do corpo, superiores (braços) e inferiores (pernas). Sentidos são
todas as funções perceptivas do mundo exterior, [...] (visão, audição, olfato,
gosto e tato). Função é a atividade desempenhada por vários órgãos
(respiratória, circulatória, digestiva, secretora, locomotora, reprodutora,
sensitiva etc.). (MIRABETE, 2012, p. 77).
Portanto a lesão que cause a quebra de
um braço e o torne debilitado permanente ou a lesão que prejudique a visão da
vítima de forma permamente enquadram-se na tipificação do art. 129, § 1°, III.
2.7.4 Aceleração de parto
Segundo o art. 129, § 1°, IV, a lesão
que cause aceleração do parto é uma lesão corporal de natureza grave. Cezar
Roberto Bitencourt (2015, p. 206) diz que:
Aceleração do parto
é a antecipação do nascimento do feto com vida. [...] É indispensável que o
feto esteja vivo, nasça com vida e continue a viver, caso contrário, se morrer,
no útero ou fora dele, configurar-se-á aborto, e a lesão corporal será
qualificada como gravíssima (§ 2°). (BITENCOURT, 2015, p. 206).
Portanto, quando o sujeito pratica
lesões corporais contra mulher grávida e em virtude destas vem a ter seu parto
acelerado e seu feto nasce e permanece com vida comete o crime tipificado no
art. 129, § 1°, IV.
2.8 Lesão corporal gravíssima
As lesões corporais gravíssimas
encontram-se descritas na mesma rubrica das lesões corporais graves, nos §§ 1º
e 2º, no entanto, a doutrina entende que os resultados das lesões elencadas no
§ 2º agravam ainda mais a pena, por isso é pacífico o uso do termo lesões
corporais gravíssimas para tratar dos fatos típicos descritos no § 2º.
(MIRABETE, 2012).
2.8.1 Incapacidade permanente para o
trabalho
A primeira hipótese de lesão corporal
gravíssima é tratada no art. 129, § 2º, I, sendo as lesões que resultem
incapacidade permanente para o trabalho. Mirabete (2012, p. 78)
[...] a lei não se
refere às ocupações habituais, mas à atividade profissional remunerada.
Distingue-se o que a lei menciona como lesão permanente, em que há uma previsão
de que a vítima não vai se restabelecer, daquilo que é perpétuo, e que se
comprova que a não houve o restabelecimento. (MIRABETE, 2012, p. 78)
Explicando sobre o período da
incapacidade para o trabalho, Damásio de Jesus diz que Permanência, como
dissemos, não significa perpetuidade. Incapacidade permanente é a duradoura,
longa e dilatada. Sempre que não se possa fixar o limite temporal da
incapacidade, deve ser considerada permanente. (JESUS, 2012, p. 173). É
importante salientar que se a vítima apresente uma incapacidade temporária para
o exercício da sua atividade laboral ele será enquadrado na hipótese do inciso
art. 129, § 1º, I, se a incapacidade for por mais de 30 dias.
2.8.2 Enfermidade incurável
O indivíduo que pratica lesão corporal
contra outrem e este vem a sofrer de enfermidade incurável, incorre na
tipificação do art. 129, § 2º, II. André Estefam diz que: “A incurabilidade
deve ser avaliada segundo o estágio da Medicina, ao tempo da ação ou omissão
[...]. Pode se tratar de qualquer doença, física ou mental, cujo prognóstico
pericialmente confirmado seja da ausência de perspectiva de cura”. (ESTEFAM,
2010, p. 172).
2.8.3 Perda ou inutilização do membro,
sentido ou função
Segundo Damásio de Jesus: “Perda é a
ablação do membro ou órgão. Inutilização é a inaptidão do órgão à sua função”.
(JESUS, 2012, p. 174). Enquanto que a lesão que acarretasse apenas a debilidade
permanente do membro, sentido ou função enquadrava-se no crime de lesão
corporal grave, a lesão que cause a perda destes sofre uma maior punição,
portanto, enquadra-se como gravíssima.
2.8.4 Deformidade permanente
No conceito de André Estefam,
deformidade “consiste na alteração sensível do fenótipo, de modo a depreciar a
imagem (física) da vítima”. (ESTEFAM, 2010, p. 172). Damásio de Jesus expõe os
requisitos necessários para que a lesão corporal seja qualificada pela
deformidade permanente, segundo ele, a deformidade deve ser permanente,
visível, irreparável, que cause dano estético e que seja capaz de causar uma
impressão vexatória (JESUS, 2012).
Nessa situação a permanência da
deformidade não é apenas duradoura, como se verifica nas hipóteses do art. 129,
§ 1º, III e § 2º, I. Nesse caso a deformidade deve ser irreparável e não apenas
duradoura (JESUS, 2012).
2.8.5 Aborto
Há aqui mais uma situação de crime
preterdoloso, onde o legislador pune a lesão corporal a título de dolo e o
aborto a título de culpa. Nesse sentido, Damásio de Jesus diz que:
O elemento
subjetivo-normativo da qualificadora é o preterdolo (CP, art. 19). Assim,
pune-se a lesão corporal a título de dolo e o aborto a título de culpa. Se o
sujeito, lesionando a integridade corporal ou a saúde da vítima, agir com dolo
direto ou eventual quanto à interrupção da gravidez e consequente morte do
feto, responderá por delito de aborto e não lesão corporal qualificada pelo
aborto. (JESUS, 2012, p. 175).
Com se verifica, é importante que fique
provado a não intenção do sujeito em provocar diretamente o aborto na vítima,
caso contrário sua conduta será enquadrada na tipificação do art. 125 do Código
Penal.
2.9 Lesão corporal seguida de morte
Delmanto, ao tratar da lesão corporal
seguida de morte explica que esse delito:
[...] também é
chamado homicídio preterdoloso ou preterintencional. A lesão inicial é punida a
título de dolo; o resultado letal que qualifica o comportamento é carreado ao
agente por culpa (CP, art. 19). Não há qualificação quando o resultado for
imprevisível ou houver caso fortuito. Se houver dolo eventual quanto ao
resultado, o crime será o de homicídio. (DELMANTO, 2010, p. 479).
Conforme diz Celso Delmanto (2010), a
lesão corporal seguida de morte é um crime preterdoloso, isso significa que o
agente não quis aquele resultado e nem assumiu o risco de produzi-lo, pois daí
seria dolo eventual e o crime seria o de homicídio. Isso se verifica na
tipificação do art. 129, § 3º, segundo o referido artigo, a lesão que “[...]
resulta morte e as circustâncias evidenciam que o agente não quis o resultado,
nem assumiu o risco de produzi-lo” responde por lesão corporal seguida de
morte.
2.10 Lesão corporal agravada contra
menor e idoso
A lesão corporal praticada como menor
de 14 (quatorze) anos ou maior de 60 tem a sua pena aumentada em 1/3. O § 7º do
art. 129 traz essa possibilidade, que na verdade é uma obrigação do juiz
agravar a pena para esses casos. Julio Fabbrini Mirabete ensina que:
O art. 263 da lei
n. 8.069, de 13 de setembro de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), deu
nova redação ao art. 129, § 7º, do CP [...]. Assim, com relação à lesão
corporal dolosa (leve ou grave) praticada contra pessoa menor de 14 ou maior de
60 anos, deve ser aumentada obrigatoriamente a pena de um terço. (MIRABETE,
2012, p. 81-82)
Mirabete ainda lembra que quando for
classificada a lesão como agravada pela idade, em face do princípio do non
bis in idem, não pode mais ser aplicado o disposto no art. 61, II, h,
do Código penal, que diz: “Art. 61. São circustâncias que sempre agravam a
pena, quando não constituem ou qualificam o crime: [...] II – ter o agente
cometido o crime: [...] h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo
ou mulher grávida”.
2.11 Lesão corporal privilegiada
A lesão corporal privilegiada é tratada
no art. 129, § 4º, do Código Penal, que diz:
Art. 129.
[...] § 4º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante
valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a
injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um
terço.
Essa modalidade de lesão corporal
implica em uma redução de pena que pode variar de um sexto a até um terço. Essa
redução ocorre quando verificado alguns dos casos previstos no tipo penal.
Segundo Julio Fabbrini Mirabete, ao tratar das lesões corporais privilegiadas,
diz que: “São causas de redução da pena, portanto, as paixões sociais
(patritismo, sentimento filial etc.) e a agressão por provocação injusta da
vítima que provoca violenta emoção” (MIRABETE, 2012, p. 82).
2.12 Violência doméstica
A lei. 10.886, de 17 de junho de 2004,
inseriu ao artigo 129 do Código Penal os 9º e 10 que tratam da violência doméstica. O
art. 44 da lei n. 11.340, de 7 de agosto de 2006, majorou a pena para as lesões
corporais cometidas por violência doméstica passando a prevê pena de 3 meses a
3 anos. Segundo Guilherme de Souza Nucci, “doméstico é o termo que diz respeito
à vida em família, usualmente na mesma casa” (NUCCI, 2012, p. 684).
Sendo assim, as lesões corporais
cometidas no seio da família serão enquadradas na situação de violência
doméstica. Podem, portanto, conforme o § 9º, sofrerem lesões corporais por
violência doméstica: “ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro,
ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das
relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade”. Mirabete ainda diz
que: “Aplicam-se, assim, os §§ 9º e 10 do art. 129, certamente, às hipóteses de
união estável ou concubinato, atual ou pretérito, e de estarem os cônjugues
divorciados ou separados, judicialmente ou de fato.” (MIRABETE, 2012, p. 83).
2.13 Lesão corporal culposa
Diz o art. 18, II, do Código Penal que
o crime é culposo quando praticado com imprudência, negligência ou imperícia.
Segundo Damásio de Jesus:
A lesão corporal
culposa apresenta um tipo simples, descrito no § 6° do art. 129, e um tipo
qualificado, descrito no § 7°. Para o autor do tipo fundamental, o CP impõe
pena de detenção de 2 meses a um ano. A sanção, porém, é aumentada de um terço
se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou
ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura
diminuir as consequências do seu ato ou foge para evitar prisão em flagrante (§
7°). (JESUS, 2012, p. 178).
Há, ainda, a lesão corporal culposa
cometida no trânsito, que será discutida oportunamente em tópico específico.
2.14
Concurso
Em certos momentos o crime de lesões
corporais é cometido mediante concurso, mas em outros momentos ele é absolvido
pelo crime fim. Mirabete diz que:
As lesões
praticadas para a consecução de outro crime são por este absorvidas quando se
tratar de crime complexo (arts. 157, 158 etc.), a não ser que haja disposição
expressa em contrário (arts. 163, parágrafo único, 227, § 2°, 228, § 2° etc.”
(MIRABETE, 2012, p. 86).
Mas no caso de abuso de autoridade que
produz lesão corporal na vítima há concurso formal, com decisões reconhecendo o
concurso material. (MIRABETE, 2012).
2.15 Ação penal e pena
Segundo Luiz Regis Prado “a ação penal
é pública condicionada à representação nas lesões leves, culposas e de
violência doméstica, e incondicionada nas demais hipóteses”. (PRADO, 2008, p.
150). Sendo assim os crimes de lesões corporais grave, gravíssimas e seguida de
morte são de ação penal pública incondicionada.
A pena para o crime de lesões corporais
varia de acordo com o tipo. O crime lesões corporais leve, descrito no art.
129, caput, do Código Penal tem pena de detenção que pode
variar de três meses a um ano. A lesão corporal grave tem pena de reclusão de
um a cinco anos. A gravíssima, tratada no § 2º do art. 129 tem pena de reclusão
de dois a oito anos. A lesão corporal seguida de morte, por ser um crime
preterdoloso, onde o sujeito é punido por dolo na conduta mais culpa no
resultado, apesar de resultar em morte não sofre a mesma punição do crime de
homicídio, segundo o art. 129, § 3º, a lesão corporal seguida de morte é punida
com reclusão de quatro a doze anos.
No caso de o agente ter cometido “o crime
impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de
violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode
reduzir a pena de um sexto a um terço”, conforme evidencia o art. 129, § 4º.
Há também hipótese de substituição de
pena, na qual o juiz, verificando o atendimento aos requisitos do § 4º do art.
129 ou se as lesões são recíprocas e não apresentam gravidade (Art. 129, § 5º),
poderá substituir a pena privativa de liberdade pela pena de multa.
A pena do crime de lesões corporais,
segundo o art. 129, § 7º, também podem ser aumentadas de 1/3 (um terço) se
ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 do Código Penal. No
caso de violência doméstica, conforme manda o § 10, a pena é aumentada de 1/3 se
as lesões foram grave, gravíssima ou seguida de morte.
Por fim há a hipótese do perdão
judicial, trazida pelo § 8º e somente sendo aplicável às lesões culposas quando
for possível aplicar o disposto no § 5º do art. 121 do CP.
2.16 Comparação com o tipo legal do
Código de Trânsito Brasileiro
Segundo o art. 303 do Código de
Trânsito Brasileiro: “Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo
automotor: Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição
de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.” É
importante ressaltar que apenas as lesões corporais culposas cometidas na
direção de veículo automotor que se enquadram na tipificação do art. 303 do
CTB, se o agente pratica dolosamente, mesmo sendo na direção de veículo
automotor responde pelo crime do art. 129 do CP. (MIRABETE, 2012).
3- Conclusão
Neste trabalho foram abordadas sobre o
artigo do Código Penal Brasileiro 129: lesões corporais, contendo suas
definições, suas classificações, exclusões entre outras.
Utilizaram-se alguns doutrinadores para
que este trabalho fosse realizado. Desta forma, lesão corporal é todo e
qualquer dano ocasionado à normalidade funcional do corpo humano.
O crime de lesão corporal é classificado
doutrinariamente, em síntese, como crime forma livre; crime material; crime de
dano, crime plurisubistente e crime unisubjetivo.
O crime de lesão corporal pode ser
descrito, conforme tipificação legal, da seguinte forma: lesão corporal leve,
grave, gravíssima, seguida de morte, agravada contra menor e idoso,
privilegiada, domestica e culposa. E ainda em certos momentos o crime de lesões
corporais é cometido mediante concurso, mas em outros momentos ele é absolvido
pelo crime fim.
Por fim, foi entendido pelo grupo outra
possibilidade para que haja esse delito: lesão corporal na direção de veículo
automotor, que se enquadra na tipificação do art. 303 do CTB.
Por: Ana C F Barbosa
Ana Carla Felix
Gustavo Zito
Liandra Carolina da Silva
Suelen Ferreira
Ana Carla Felix
Gustavo Zito
Liandra Carolina da Silva
Suelen Ferreira
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