O
processo penal tem como finalidade primordial e específica disciplinar as
normas jurídicas concernentes à aplicação e dosagem correta da pena, atribuindo
ao autor do fato típico a sanção correspondente a norma jurídica violada.
Dentro
da processualística brasileira, o processo penal é o ramo mais importante do
Direito, haja vista que disciplina e decide sobre o “status libertatis” do cidadão brasileiro.
O inquérito policial nada
mais é do que o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária, com
a finalidade de apurar a autoria e a materialidade de uma infração penal, para
que o titular da ação penal possa ingressar em juízo pedindo a aplicação da lei
ao caso concreto.
A
persecução penal divide-se em duas fases distintas: a fase administrativa e a fase judicial.
a primeira fase é realizada
através do Inquérito Policial e a segunda fase é realizada em Juízo, pelo órgão
acusatório (Ministério Público ou o ofendido).
Posto
isto, concluímos que a finalidade do Inquérito Policial é a de apurar a ocorrência de
uma infração penal, sua materialidade e conseqüente autoria.
O
Inquérito Policial é uma peça meramente investigatória, escrita e sigilosa. É
através deste procedimento administrativo, realizado pela polícia judiciária,
que se colhem elementos e evidências necessárias para fundamentar uma eventual
ação penal.
a) Peça Investigatória: o Inquérito Policial se
destina a fazer investigações sobre o fato criminoso e de seu autor. Dentro do
Inquérito Policial existem diversas peças dentre as quais podemos destacar - o
indiciamento do acusado, declarações da vítima, oitiva de testemunhas,
perícias, portaria.
O
Inquérito Policial é também chamado e classificado como “inquisitivo”, pois o acusado não é pessoa de direitos, mas sim sujeito e objeto
de investigações.
b) Peça Escrita: o
Inquérito Policial é sempre escrito, atualmente ele é datilografado.
c) Peça Sigilosa: é sigiloso, porque no curso
das investigações policiais deve preponderar o interesse da coletividade e
principalmente o direito do acusado.
O advogado não participa
ativamente do Inquérito Policial, mas deve, sempre que
possível, acompanhar o seu cliente nas eventuais diligências (como no
interrogatório e nas perícias) e tomar conhecimento das provas colhidas, haja
vista que na fase inquisitorial o acusado está sempre sujeito a constrangimento
e abusos por parte da polícia judiciária.
Também pode o advogado,
dentro do Inquérito Policial, peticionar ao Delegado de Polícia solicitando
alguma diligência ou produção de alguma prova, mas fica a critério da
Autoridade Policial atender ou não a solicitação.
É direito do advogado
examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, qualquer
Inquérito Policial, findo ou em andamento ainda que concluso à Autoridade
Policial, podendo copiar peças ou tomar apontamentos- ex vi artigo 7o., inciso XIV do Estatuto da Ordem dos Advogados do
Brasil.
É de
suma importância salientar que o advogado não interfere no Inquérito Policial no
sentido de fazer defesa de seu constituinte, mas sempre deve acompanhar e
fiscalizar a colheita das provas a fim de que o réu não seja prejudicado
futuramente.
Muitas
vezes a Polícia Judiciária separa o acusado dos demais detentos, com o fito de
que o acusado não
influa nas investigações e na colheita das provas durante a fase do
Inquérito Policial. É o que se denomina de “incomunicabilidade”, onde o acusado
fica recolhido em cela separada pelo prazo máximo de 03 (três) dias.Tal proibição, não
atinge o advogado que poderá livremente comunicar-se com o acusado,
reservadamente. Tal direito do profissional da área do Direito está
previsto no Estatuto dos Advogados em seu artigo 7o., inciso III da Lei
8.906/94.
O
impedimento ou o desrespeito a norma, evitando que o advogado entreviste-se normalmente
com o preso constitui verdadeiro constrangimento ilegal, passível de impetração de
ordem de Hábeas Corpus contra a
Autoridade Coatora.
O
Inquérito Policial é instaurado:
a) Por Auto de Prisão em Flagrante Delito ;
b) Por Portaria da
Autoridade Policial;
c) Através de
requerimento por escrito do ofendido;
No
primeiro caso, o processo penal tem início quando o acusado é preso cometendo a
infração penal, logo após cometê-la ou quando após o delito ele é surpreendido
com instrumentos, objetos que façam presumir a autoria do delito. Inicia-se com
a peça processual denominada “Auto de Prisão em
Flagrante Delito ”.
No
segundo caso, o Inquérito Policial tem início de ofício, mediante a simples
comunicação à Autoridade Policial da ocorrência de um delito. É a denominada “notitia
criminis”.
O
Inquérito Policial também poderá ter início através de iniciativa do ofendido
ou de seu representante legal, levando a “notitia
criminis” ao Delegado de Polícia ou representando a ele a ocorrência do fato por
escrito.
Nos casos
de crimes de ação
penal privada, o Inquérito
Policial só
será instaurado mediante requerimento por escrito do ofendido ou de seu representante legal.
O
Inquérito Policial também pode ser instaurado:
a) Por requisição do
Ministério Público ou da Autoridade Judiciária (Juiz);
b) Por requisição do
Ministro da Justiça.
Quando
o delito depender de representação, o ofendido deverá representar a Autoridade,
manifestando o seu desejo de ver o seu agressor processado.
A representação é o ato pelo qual o ofendido
ou seu representante legal, manifesta à Autoridade Policial o seu desejo de ver
processado o seu ofensor. O “dominus
littis” da Ação Penal, nos casos de delitos que dependem de representação é
sempre o Promotor de Justiça.
O
Inquérito Policial, por ser uma peça meramente investigatória e inquisitiva,
tem sempre valor
probatório relativo. O Inquérito Policial tem valor probatório como
qualquer outra prova, não valendo mais e nem menos do que outras (sistema de valoração das provas e princípio do
livre arbítrio e convencimento do Juiz).
Se o acusado estiver
preso, a polícia tem o prazo de 10 (dez) dias para concluir, relatar e remeter o Inquérito Policial a juízo. Se estiver solto, o
prazo para concluir, relatar e remeter o Inquérito Policial a juízo é de 30 (trinta dias). O
que ocorre na prática é que, se o réu estiver solto, muito raramente o
Inquérito Policial se finda nos trinta dias, sendo comum o pedido de dilação de
prazo para conclusão do procedimento administrativo.
Depois
de realizadas todas as diligências necessárias a apuração do delito, a
Autoridade Policial encerra o Inquérito Policial com o seu Relatório, onde
esta narra minuciosamente ao Juiz os fatos objetos do procedimento
inquisitório.
Relatado
o Inquérito Policial, o Ministério Público pode:
a) Oferecer Denúncia
contra o acusado;
b) Opinar sobre o
arquivamento do Inquérito Policial;
c) Requerer a devolução
dos autos à Delegacia de Polícia para a realização de novas diligências que
entender necessárias para o esclarecimento da verdade (acareações, perícias,
oitiva de novas testemunhas, requerer o formal indiciamento do acusado, etc.)
No
primeiro caso, com a Denúncia inicia-se o processo criminal em Juízo, e sua
tramitação regular segundo o procedimento adotado para cada crime.
No
segundo caso, arquivado os autos o acusado não terá contra si nenhuma ação
penal, encerrado está o procedimento policial.
No
terceiro caso, nada impede que depois de remetido e relatado o Inquérito
Policial, o Ministério Público peça ao Juiz a devolução dos autos a Autoridade
Policial a fim de que esta realize as diligências requeridas pelo órgão
acusatório.
A Autoridade Policial jamais poderá arquivar qualquer
Inquérito Policial, haja vista que se trata de atribuição do Juiz de Direito, após
manifestação do órgão do Ministério Público.
Sendo
arquivados os autos de Inquérito Policial, pelo Juiz, a pedido do Ministério
Público não pode ser iniciada a Ação Penal sem novas provas. Veja a este
respeito a Súmula 524 do STF.
A
classificação da infração penal pela Autoridade Policial é sempre
provisória, podendo ser alterada a qualquer tempo pela Denúncia ou pela
sentença.
O Réu Menor é
aquela pessoa que é menor de 21 (vinte e um) anos e maior de 18 (dezoito anos)
quando da prática do delito.
Curador é aquela pessoa que acompanha
o menor acusado evitando constrangimento ou abusos contra ele na fase policial
ou em Juízo. Age
o curador como defensor dos direitos do acusado na fase policial e na fase
judicial.
Na
fase policial a falta de curador constitui mera irregularidade, mas no caso de
prisão em flagrante delito a presença do curador é essencial, sob pena de relaxamento da prisão
em flagrante. Já na fase
judicial, a ausência do curador para defender os interesses do acusado implica
em nulidade, pois se trata de formalismo indispensável e necessário.
Como
dito alhures, o curador pode ser qualquer pessoa, mas entendemos que deve ser
preferentemente um advogado, visto que o profissional é o responsável pela
defesa, do acusado em Juízo quando da ação penal. Não há exigência legal quanto
a qualidade profissional do curador nomeado para assistir o acusado na fase
policial, podendo a designação recair sobre acadêmico estagiário ou qualquer
pessoa idônea. Não pode, porém, ser curador, analfabeto e sem condições de
exercer o múnus.
A Identificação
Datiloscópica nada mais é que a identificação criminal do autor da infração
penal através de uma planilha, onde é colhido pela Autoridade Policial, os
dados pessoais e sua identificação pelo meio de colheita de impressões
digitais.
A
Constituição Federal dispõe que o civilmente identificado não será submetido a
identificação criminal. Utiliza-se para tal fim, a Carteira de Identidade ou
meio equivalente. Existindo dúvida a respeito da identidade do acusado (v.g.
quando há suspeita de uso de documento falso), poderá ser o acusado
identificado criminalmente. Tal procedimento ocorre nos casos em que existem
fortes presunções
de autoria e materialidade do delito, quando existe praticamente certeza
e convicção de que o acusado seja o autor do crime a ele imputado.
Se
houver dúvida, é melhor que o acusado seja ouvido em Declarações, sendo
indiciado “a posteriori” quando
existir nos autos elementos de convicção que apontem o acusado como autor do
delito. No meio policial indiciamento é a mesma coisa de “fichado”.
Em
termos jurídicos, pode-se conceituar indiciamento como simplesmente “a formalização da acusação, por existir
contra os acusados elementos de convicção que levem a conclusão da autoria do
delito”.
Existindo
algum eventual vício no Inquérito Policial, este vício não anula a ação penal,
uma vez que se trata de peça meramente informativa, inquisitória e
administrativa. Nunca se deve falar em nulidade da ação penal por vício contido
no Inquérito Policial.
O
mero indiciamento em inquérito policial não constitui constrangimento ilegal a
ser sanado por intermédio de hábeas corpus.
O
princípio do contraditório é inaplicável ao inquérito policial, posto que
inexista instrução criminal e sim investigação criminal de natureza
inquisitiva.
Nada
impede que a autoridade policial de uma circunscrição investigue delito
praticado em outra, que repercuta em sua competência.
A
decisão condenatória baseada exclusivamente no inquérito policial contraria o
princípio constitucional do contraditório. Em outra oportunidade o STF decidiu
que o inquérito policial não pode servir como suporte para uma decisão
condenatória, porque as provas testemunhais só adquirem valor probatório quando
repetidas em Juízo.
O
inquérito policial não é imprescindível ao oferecimento da denúncia ou da
queixa, desde que a peça acusatória tenha fundamento em dados de informação
suficientes à caracterização da materialidade e da autoria do delito.
O
desconhecimento da autoria do crime não impede a instauração do Inquérito
Policial, haja vista que o inquérito tem como finalidade apurar a materialidade
e a autoria do delito. A autoridade policial ao tomar conhecimento da prática
de um crime deve sempre instaurar o Inquérito, não se trata de faculdade, mas
sim de dever. Nos crimes de ação penal pública condicionada a representação, o
delegado não pode instaurar o inquérito sem o oferecimento da representação,
que é uma condição de procedibilidade.
A não
nomeação de curador a indiciado menor durante o Inquérito Policial não tem
nenhuma conseqüência.
Constitui
constrangimento ilegal o desarquivamento de inquérito policial e conseqüente
oferecimento de denúncia e seu recebimento sem novas provas. Ao revés, o
desarquivamento de inquérito policial diante de outros elementos de prova, não
constitui nenhum constrangimento ilegal. Novas provas são somente aqueles
elementos probatórios que produzem alguma alteração probatória sobre a
materialidade e a autoria do delito, devendo ser inovadora.
É
irrecorrível o despacho que determina o arquivamento ou desarquivamento do
Inquérito Policial, não cabendo recurso de qualquer espécie. O arquivamento do
inquérito policial não pode ser feito de oficio pelo juiz, sem ouvir
previamente o órgão do Ministério Público.
O
inquérito policial é instaurado de acordo com a localidade que se consumou a
infração, também não se impede que o inquérito policial seja distribuído pela
competência em razão da matéria (tóxicos, roubo a banco, delegacia da mulher).
O
professor Júlio Fabrini Mirabete entende que a incomunicabilidade foi revogada
pela nova Constituição, asseverando que o preso, quando no país for decretado o
Estado de Sítio, é vedada a sua incomunicabilidade, entendendo assim o
legislador na situação especial, porque então não aplicá-la na situação geral?
Já o professor Damásio E. De Jesus entende de forma diversa.
O
Delegado de Polícia tem livre arbítrio no Inquérito, pode ele, por exemplo,
ouvir 3 testemunhas, como ouvir 50 testemunhas, a sua função é angariar provas
e elementos sobre a materialidade e a autoria do delito.
O juiz
ao deferir a dilação de prazo deve sempre fixar novo prazo para a conclusão do
Inquérito Policial, prazo este nunca superior a 30 (trinta dias).
Por
fim, deve ser acrescentado que com o advento da Lei 9.009/95, não se instaura
mais inquérito policial nos crimes de menor potencial ofensivo[1] e nas contravenções
penais, mas sim um Termo Circunstanciado de Ocorrência.
Referida matéria
será tratada com maior profundidade no capítulo inerente aos Juizados Especiais
Criminais.
Na
maioria dos delitos previstos em nosso Código Penal , o direito de punir (jus puniendi) pertence exclusivamente ao
órgão estatal, e o autor da ação penal, o dono da ação (dominus littis) é o Ministério Público.
Entretanto,
existem delitos em que o interesse do ofendido à repressão do delito se
sobrepõe ao interesse do Estado. Isto ocorre no caso dos crimes averiguados por
intermédio da Ação Penal Privada, segundo o qual o Estado transfere ao
particular o direito de perseguição e de acusar (jus acusationis).
A
Ação Penal Privada tem início por intermédio de uma peça processual denominada
de queixa crime, que, grosso modo, é a mesma coisa que a Denúncia,
nos crimes de Ação Penal Pública Incondicionada ou Condicionada à
Representação.
A
Queixa Crime deve ter os mesmos requisitos da Denúncia, que são os seguintes:
a) a
exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias;
b) a
qualificação do acusado ou esclarecimentos que possam identificá-lo;
c) a
classificação do crime;
d)
quando necessário, o rol de testemunhas.
Também
existe uma diferença primordial entre a Queixa Crime e a Denúncia, quanto ao
seu subscritor: na Denúncia o subscritor é o membro do Ministério Público;
enquanto que na Queixa Crime é o procurador do ofendido (advogado) com poderes
expressamente outorgados.
É
requisito essencial que a procuração “ad
judicia”, outorgada ao advogado do ofendido para a propositura da Queixa
Crime, contenha em seu corpo, os poderes especiais que autorizam aquele
profissional do Direito a propor a Queixa Crime e que na própria procuração
este narre os fatos tidos como delituosos - “narração sucinta dos fatos criminosos”.
Também
são requisitos da Queixa Crime, “ex vi”
do artigo 43 do Código de Processo Penal:
a) que o fato narrado constitua crime, ao
menos em tese;
b) que não esteja presente nenhuma causa
extintiva de punibilidade;
c) que as partes sejam legítimas e que
não falte condição exigida por lei, para o exercício da Ação Penal.
Nenhum
crime apurado por meio de Ação Penal Privada pode ser feito através do
Ministério Público, pois falta a este legitimidade para agir, atuando o
Ministério Público na Ação Penal Privada, como apenas e tão somente “custos
legis”- fiscal da lei.
Para
a instauração do inquérito policial nos crimes de ação penal privada, a “conditio sine qua non” é o requerimento
por escrito do ofendido à Autoridade Policial para que esta comece o
procedimento criminal contra o ofensor da norma penal.
Antes
do advento do Estatuto da Mulher Casada, a mulher não podia sem o consentimento
(outorga uxória) de o marido promover a Ação Penal Privada, segundo o que
dispunha o artigo 35 do Código de Processo Penal. Hoje, com o advento na nova
Constituição Federal, a mulher pode livremente promover e oferecer a Queixa
Crime, mesmo sem a autorização de seu marido.
Como
em todos os demais crimes, o Inquérito Policial é desnecessário para o
oferecimento da Queixa Crime, desde que o ofendido possua em mãos peças
informativas com as quais se conclua a existência de indícios suficientes de
autoria e de materialidade.
Caso
contrário, o Inquérito Policial torna-se necessário e pode até ocorrer que a
Queixa Crime seja rejeitada pelo Juiz por falta de justa causa.
A
Queixa Crime somente pode ser oferecida pelo ofendido ou pelo seu representante
legal.
Para
sabermos se um crime se processa pelo intermédio de Ação Penal Privada, basta
atentarmos para a Parte Especial do Código Penal, onde constará a expressão “somente se procede mediante queixa”.
Contendo esta expressão o crime será averiguado mediante Ação Penal Privada.
A Ação Penal
Privada Personalíssima é aquela ação penal privada que só
pode ser promovida pelo ofendido. Somente o ofendido pode exercer o “jus puniendi”. São exemplos de Ação
Penal Personalíssima: o adultério (artigo 240 do Código Penal) tipo este já
revogado pela 11.106/05, e induzimento a erro essencial e ocultação de
casamento (artigo 236 do Código Penal). Neste passo deve ser registrado que
atualmente a única possibilidade de ação penal privada personalíssima é o caso
de ocultação de vício de casamento (CP, art. 236), tendo em vista que o delito
de adultério foi revogado pela Lei 11.106/05, típico caso de abolitio
criminis
[1]
Crimes de menor potencial ofensivo são todos os delitos cuja pena máxima
seja igual ou inferior a dois anos que são de competência do Juizado Especial
Criminal que será tratado em
capítulo à parte.
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